Título: Avanços e contradições da economia
Autor: Lacerda, Antonio Corrêa de
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/03/2007, Economia, p. B2

O atual momento da economia brasileira é contraditório. Ao mesmo tempo que fica patente o fortalecimento da sua blindagem relativamente às turbulências internacionais, com a melhora dos fundamentos macroeconômicos, a falta de aprimoramento nas políticas fiscal, monetária e cambial rouba parcela expressiva do crescimento potencial da economia brasileira.

A frouxidão do (des)controle dos gastos correntes e o excessivo conservadorismo na política monetária, especialmente quanto à trajetória da queda dos juros, aliados à excessiva valorização cambial, provocam estragos na geração de valor agregado local, em última instância no Produto Interno Bruto (PIB), especialmente na indústria de transformação.

Há progressos importantes em curso. Os benefícios somente não se traduzem num crescimento mais robusto e sustentável por causa dos fatores adversos das políticas macroeconômicas. A redução da vulnerabilidade externa da economia brasileira, dada pelo superávit consistente das contas correntes do balanço de pagamentos e o volume recorde de reservas cambiais, permitiu a redução expressiva da percepção de risco externo. Há uma evidente incongruência entre o cenário descrito e a relutância do Banco Central em manter uma taxa de juros reais ainda cerca de quatro vezes a média dos países em desenvolvimento.

As recentes turbulências internacionais a partir da crise nas Bolsas de Xangai têm gerado maior instabilidade, que afeta o desempenho do mercado de capitais. No entanto, vale destacar que nos últimos quatro anos a valorização das ações havia acumulado um crescimento de 265%. Também favorecido pela liquidez mundial, o valor de mercado das empresas de capital aberto no Brasil atingiu o nível recorde de R$ 1,5 trilhão, o equivalente a 74% do PIB. Essa participação se restringia a apenas 38% no ano 2000.

A valorização dos mercados também viabilizou a formação de ¿bolhas¿, cuja correção vem provocando volatilidade. Mas as perspectivas continuam favoráveis. As captações no mercado brasileiro, por conta principalmente das emissões de ações e debêntures, atingiram R$ 109 bilhões em 2006 e deverão crescer mais 30% este ano. O ingresso de investimentos estrangeiros e a pressão do mercado por mais transparência e regras de governança das empresas também apontam para esse sentido.

A esse movimento se juntam os financiamentos realizados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que, em 2006, atingiram R$ 52,3 bilhões, representando um crescimento de 11,3% em relação ao ano anterior. As aprovações de pedidos de financiamento chegaram a R$ 74,3 bilhões, 36,3% superiores ao ano anterior, denotando um crescimento ainda maior dos financiamentos em 2007.

Outro fenômeno positivo observado é a expansão das emissões de empresas brasileiras na Bolsa de Valores de Nova York (as ADR¿s - American Depositary Receipts), que, em 2006, atingiram US$ 221 bilhões, praticamente o dobro do volume do ano anterior.

Todos esses fatores devem contribuir para uma ampliação significativa dos investimentos nos próximos anos, eliminando gargalos da infra-estrutura e aumentando a capacidade produtiva da economia. São alternativas de financiamento para viabilizar os projetos de expansão das empresas, tanto no mercado doméstico quanto estratégias de internacionalização.

Nesse sentido, as perspectivas futuras são bastante promissoras. A queda da taxa de juros doméstica vai fomentar a migração das aplicações em renda fixa, melhorando o ¿apetite para o risco¿, assim como viabilizar a diminuição da relação dívida pública/PIB. Se o cenário internacional continuar favorável, o que é provável, o Brasil obterá o ¿grau em investimento¿ das agências de classificação de risco em alguns poucos anos.

Mas tudo isso não deve servir de estímulo ao imobilismo ou ao excessivo conservadorismo nas políticas macroeconômicas. A Nação tem pressa. Apesar desses dados satisfatórios, há uma cada vez mais visível deterioração social no País, em grande parte decorrente do baixo crescimento econômico e da inação do Estado brasileiro.