Título: Manufaturado tem menor fatia das vendas em 24 anos
Autor: Veríssimo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/05/2007, Economia, p. B8

A valorização do real reduziu a participação dos produtos manufaturados nas exportações para o menor nível em 24 anos. O produtos básicos ganham terreno e atingem o maior valor desde 1987.

Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram que em 2006 os manufaturados representavam 54,34% das exportações e os básicos, 29,30%. Nos primeiros quatro meses de 2007, a participação dos manufaturados caiu para 53,9% e a dos básicos subiu para 30,2%.

O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, acredita que está havendo 'retrocesso'. 'Estamos na contramão: enquanto o mundo exporta manufaturados, o Brasil exporta commodities', diz.

Para o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Edgard Pereira, esse quadro amplia a vulnerabilidade estrutural da balança comercial brasileira. 'Isso não fica claro porque estamos num ciclo muito forte de preços no mercado internacional', diz.

Para ele, há 'uma regressão relativa'. 'Não estamos andando para trás, mas ficando para trás em relação ao resto do mundo', comenta. 'O Brasil tem uma estrutura concentrada em commodities, enquanto os concorrentes de países desenvolvidos estão ampliando os produtos de maior valor agregado.'

Também são apontados como fatores impeditivos ao crescimento das exportações de produtos de maior valor agregado o sistema tributário brasileiro e a falta de investimentos em inovação tecnológica. Castro lembra que as vendas externas são tributadas e há uma demora na devolução dos créditos para o exportador.

O diretor do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), João Alberto de Negri, não acredita que isso seja uma tendência. 'Não vejo possibilidade de o Brasil ter uma especialização em commodities', observa. Mas ele alerta que, sem investimentos pesados em inovação tecnológica nas empresas, o 'virtuosismo exportador' brasileiro vai se arrefecer nos próximos anos.

'O Ipea prevê que nos próximos anos vamos ter um arrefecimento da competitividade internacional do Brasil caso não se invista em desenvolvimento e inovação tecnológica.'

Para Negri, 'a visão cega de curto prazo' impede o Estado de fomentar as empresas a investir pesadamente em inovação tecnológica. 'O importante é que as questões macroeconômicos estão resolvidas no Brasil', diz ele. 'Temos que apostar nas questões microeconômicas para agregar conhecimento aos bens que o nosso País exporta.'

Segundo ele, essa é a chave do processo de competição. 'Quem está olhando o curto prazo preocupado com flutuações de curto prazo não está conseguindo enxergar o que vai acontecer na economia nos próximos anos', argumenta.

O presidente do Ipea, Luiz Henrique Proença Soares, alerta que não há muito a ser feito para conter a valorização do real. 'O Estado tem que ter mecanismos de promoção e incentivo para que essa mudança de patamar ocorra. Porque é daí que vem a competitividade, inclusive nos setores em que o Brasil hoje é líder, como o etanol.