Título: A dragagem dos portos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/09/2007, Notas & Informações, p. A3

Ao permitir que empresas estrangeiras executem trabalhos de dragagem dos portos brasileiros, a Medida Provisória (MP) nº 393, assinada no dia 19, derruba um dos principais obstáculos à melhoria das operações do nosso sistema portuário. Até agora, só empresas brasileiras podiam executar o serviço de dragagem e, de acordo com fontes do governo, apenas três delas tinham condições e porte para fazer os trabalhos necessários nos maiores portos do País, em particular o de Santos. Por causa da quase inexistente concorrência, as empresas cobravam preços elevados pelos serviços e nem sempre estavam interessadas nos trabalhos em determinados portos.

A MP 393 instituiu um novo modelo para a execução dos serviços de dragagem nos portos, que é o Programa Nacional de Dragagem Portuária e Hidroviária. Por esse modelo, os contratos obedecerão ao critério que o governo chama de ¿dragagem por resultado¿, que tem dois componentes. O primeiro deles é a obra em si, os serviços de engenharia destinados a aprofundar, alargar ou expandir os canais de navegação e os berços de atracação. O segundo é a prestação de serviços por um prazo predeterminado para a manutenção das condições estabelecidas no projeto, inclusive a profundidade e a largura do canal.

Antes, a responsabilidade da empresa contratada terminava no momento da entrega da obra. Agora, a empresa continuará responsável pela manutenção das condições especificadas pelo prazo de cinco anos.

A nova regra será aplicada nas obras que o governo vai contratar para melhorar as condições de operação do Porto de Santos. O estuário do Porto de Santos tem hoje profundidades diferentes. Na entrada do canal, é de 14 metros; no meio do porto, é de 13; e, na área do fundo, diminui para 12 metros. Isso impede a entrada de grandes navios no porto. Alguns especialistas consideram necessária uma profundidade de pelo menos 17 metros para Santos receber grandes navios, mas o governo fará uma licitação para a contratação de obras de aprofundamento do canal para 15 metros. A largura do canal deverá ser ampliada de 220 para 250 metros, o que, de acordo com o secretário especial de Portos, Pedro Brito, permitirá o fluxo em mão dupla. Concluído o serviço, a empresa contratada deverá manter esses padrões pelo prazo de cinco anos.

Santos é apenas um dos problemas sérios de dragagem que o governo precisa resolver com urgência. Um estudo preliminar do Ministério dos Transportes e da Secretaria Especial dos Portos concluído há algum tempo indicou a necessidade de remoção de 1 milhão de metros cúbicos de material em cinco bacias. As três empresas habilitadas para esse tipo de serviço não teriam condições de atender à demanda por dragagem para combater o assoreamento dos portos, daí a necessidade de abertura desse mercado para empresas estrangeiras, como fez a MP 393.

Outra mudança introduzida no sistema de serviços de dragagem é a possibilidade de juntar os trabalhos em dois ou mais portos num só contrato, para torná-lo mais atraente para as empresas especializadas.

Os portos mereceram um programa especial de emergência no primeiro mandato de Lula, a Agenda Portos, um programa modesto que previa investimentos de R$ 220 milhões em três anos e cujos resultados foram ainda mais modestos. Agora, eles fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que previu investimentos de R$ 2,668 bilhões até 2010 em obras de melhoria, mais R$ 1 bilhão para os serviços de dragagem. É menos do que o necessário para resolver um problema que os empresários do setor de logística consideram crítico, mas é bem mais do que se investiu no primeiro governo Lula.

Em artigo publicado há algumas semanas no Estado, o diretor-geral no Brasil da CMA CGM (a terceira maior armadora do mundo), Nelson Carlini, observou que em alguns terminais portuários do País o tempo de espera para embarque e desembarque de contêineres pode chegar a 300 horas. A demora tem a ver com problemas de infra-estrutura, mas também com a burocracia e com a ineficiência operacional dos portos.