Título: Acordo põe em risco planejamento energético
Autor: Landim, Raquel
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/07/2009, Economia, p. B1

Para especialistas, permitir que o Paraguai negocie parte da energia no mercado livre é um erro

Renée Pereira

A permissão para o Paraguai negociar uma fatia da energia elétrica produzida por Itaipu no mercado livre brasileiro poderá desorganizar o planejamento energético do País. Para cobrir o espaço deixado pela retirada de eletricidade do mercado cativo (atendido pelas distribuidoras), o governo terá de fazer novos leilões, afirma o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Nivalde Castro.

Na avaliação dele, isso significa dar mais espaço para as térmicas a óleo diesel e óleo combustível, que, além de serem mais poluentes, são extremamente caras. Isso porque a construção de uma hidrelétrica leva mais tempo para ser concluída do que uma térmica. "Esta decisão foi pensada e decidida no Ministério das Relações Exteriores. Eles estão definindo a política energética do País."

O professor da Universidade de São Paulo José Goldemberg concorda com Castro. "Ao tentar ajudar o Paraguai, o governo corre o risco de sair às pressas para realizar novos leilões para segurar as pontas. Mais uma vez, a história se repete", afirma ele, referindo-se às concessões do Brasil à Bolívia no mercado de gás natural. Goldemberg critica a posição do governo brasileiro de agir como se todos os problemas da infraestrutura nacional, em especial os de energia, estivessem resolvidos. "Se não fosse a crise e o generoso regime de chuvas, teríamos problemas em breve."

A crítica é repetida pelo diretor da Câmara Brasileira de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires. Na avaliação dele, as concessões do Brasil para o Paraguai são mais uma tentativa de se firmar como líder da América Latina. "Para isso, é preciso posar de país rico que precisa ajudar aos pobres." Para o executivo, ao contrário do que o Paraguai possa imaginar, os negócios no mercado livre de energia nem sempre são vantajosos, já que os preços sofrem grandes oscilações.

"Não duvido nada que quando o preço estiver baixo, eles batam a nossa porta para, mais uma vez, renegociar o contrato." Outro aspecto importante, completa ele, é o risco embutido nos contratos que poderão ser firmados entre o Paraguai e o consumidor livre. "Muitos não vão querer comprar essa energia com medo de o contrato não ser cumprido."

Apesar das ordens do presidente Lula para atenuar os impactos entre os consumidores, mais uma vez, o principal perdedor será o consumidor residencial. No caso do aumento da receita do Paraguai pela cessão de energia, o reajuste na conta ficará abaixo de 1%, calculam técnicos da Eletrobrás.

Isso só será possível porque o governo está buscando uma maneira de absorver o restante do impacto. Estão sendo analisadas as opções de passar a conta para o Tesouro Nacional, para o caixa da Eletrobrás, ou até cortar despesas da própria Itaipu. O cálculo referente ao deslocamento da energia do mercado cativo para o livre só será conhecido em 120 dias, quando todas as regras serão definidas.

COLABOROU RAQUEL LANDIM