Título: Máfia teria falsificado passagens, diz relatório
Autor: Recondo, Felipe; Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/07/2009, Nacional, p. A7

Objetivo era ocultar que bilhetes aéreos vinham da cota parlamentarObjetivo era ocultar que bilhetes aéreos vinham da cota parlamentar

Felipe Recondo e Denise Madueño

O relatório final da sindicância que investigou a venda irregular de bilhetes aéreos na Câmara mostra que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e Eros Grau foram vítimas do esquema que ficou conhecido como "máfia das passagens". Os dois viajaram com passagens retiradas das cotas dos deputados Fernando de Fabinho (DEM-BA), Paulo Roberto (PTB-RS) e Fernando Coruja (PPS-SC).

O presidente do Supremo e sua mulher, Guiomar, compraram com dinheiro próprio, em uma agência de turismo, as passagens aéreas do trecho São Paulo-Nova York-São Paulo. Porém, os tíquetes foram retirados pela empresa de viagem das cotas dos deputados Paulo Roberto e Coruja.

Eros Grau viajou de São Paulo para o Rio e posteriormente para Brasília com passagens pagas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) para ministrar a aula inaugural do primeiro semestre letivo de 2008. A passagem foi devidamente paga pela instituição de ensino, mas o bilhete na verdade pertencia à cota do deputado Fernando de Fabinho.

ESTRATÉGIA

Sindicância da Câmara que apurou a irregularidade revelou que as agências falsificavam os bilhetes, suprimindo as informações sobre a forma de pagamento, para que os ministros não desconfiassem da origem das passagens.

"Os trechos de viagem foram pagos com MCOs (crédito em favor de um cliente) de parlamentares, mas o bilhete encaminhado às autoridades judiciárias, excelentíssimos ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, foi adulterado para fazê-los crerem que o custeio havia sido feito com recursos de outra natureza", concluiu o relatório final da sindicância.

As apurações e depoimentos tomados pela comissão mostraram que os assessores encarregados de requisitar as passagens para os deputados negociavam a venda das cotas para as agências.

Uma ex-servidora da Câmara - Rosimere Gomes da Silva - confirmou em depoimento à comissão de sindicância que desde 2007 vendia créditos da cota de um parlamentar, sem mencionar a que deputado se referia.

Diante desses fatos, a comissão sugeriu a instauração de processo administrativo disciplinar para avaliar a conduta desses servidores.

O resultado da investigação já foi encaminhado ao corregedor da Câmara, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), para as devidas providências.

PROIBIÇÃO

No total, 44 processos disciplinares foram abertos. O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), proibiu a divulgação do relatório da comissão de sindicância, para isso alegando questões jurídicas.

Pessoas que tiveram acesso ao documento, no entanto, afirmam que 39 gabinetes estão envolvidos na venda de passagens.

A comissão, formada por três servidores do quadro da Câmara, não tinha poder para investigar os parlamentares, mas o documento apresenta indícios fortes do envolvimento de cerca de cinco deputados no comércio irregular das passagens aéreas, ainda de acordo com os que leram o relatório.

Os parlamentares serão investigados pela corregedoria e poderão responder a processo de cassação do mandato, no Conselho de Ética da Casa, por quebra de decoro parlamentar.

Com base no relatório, o corregedor poderá optar por criar uma nova comissão para analisar o grau de participação de deputados na "máfia das passagens".

OPERADORES

A comissão chegou a cinco operadores do esquema nas agências de turismo, segundo revelaram os que tiveram acesso ao documento. O resultado da investigação foi encaminhado ao Ministério Público Federal.

TRECHO

"Os trechos de viagem foram pagos com MCOs (crédito em favor de um cliente) de parlamentares, mas o bilhete encaminhado às autoridades judiciárias, excelentíssimos ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, foi adulterado para fazê-los crerem que o custeio havia sido feito com recursos de outra natureza"

Conclusão do relatório final da sindicância que investigou a venda irregular de bilhetes aéreos na Câmara dos Deputados