Título: Consumidor lida com a inflação de um novo jeito
Autor: Chiara, Márcia De
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2008, Economia, p. B6

Se no passado o consumidor estocava produtos, agora deixa de comprar mercadoria que sobe muito de preço

O brasileiro reagiu de forma racional à disparada dos preços dos alimentos nos últimos meses. Se no passado, na época da inflação galopante, ele comprava grandes volumes dos produtos majorados, fazia estoques para preservar o poder de compra do dinheiro que diminuía no dia seguinte, corroído pela inflação, hoje está cauteloso.

¿O consumidor reduziu as compras dos alimentos que tiveram reajustes expressivos nos últimos meses. A primeira reação foi não comprar¿, constata o vice-presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas), Martinho Paiva Moreira.

Um levantamento preliminar feito pela entidade revela que os volumes vendidos de feijão e de massas caíram 10% e 5%, respectivamente, nos últimos seis meses. Na análise de Moreira, o brasileiro está reagindo a esse surto inflacionário de maneira mais inteligente do que no passado.

¿O consumidor não se dá por vencido: substitui marcas e percorre várias lojas para manter o nível de consumo.¿ Ele atribui esse movimento de freada nas compras de produtos majorados a um leque maior de opções tanto de marcas como de supermercados em relação ao que existia a 15 anos atrás.

A dona de casa Heloisa Helena Máximo, de 56 anos, casada e mãe de três filhos, confirma essa mudança de comportamento. ¿Hoje eu não faço mais estoque. Procuro marcas alternativas e supermercados que fazem promoções¿, diz a dona de casa.

Até quarta-feira passada, Heloisa Helena já tinha ido a três supermercados em menos de uma semana, só em busca de oferta. ¿Fui ao Roldão, ao Extra e ao Carrefour¿, conta. Foi ao Extra porque a cebola estava barata, ao Carrefour por causa da promoção do leite e no Roldão para comprar carne, que estava também em oferta.

Comparando o momento atual com os anos de hiperinflação, Heloisa Helena diz que hoje há mais opções de supermercados e marcas. ¿Não sou fiel à marca. Vejo quem é o fabricante do produto que, na maioria das vezes, é o mesmo que produz a marca líder e compro.¿

A advogada aposentada Iara Navas, de 67 anos, diz que, nos últimos três meses, passou a comprar só o que está em promoção, mesmo marcas que não conhecia, só para se resguardar dos aumentos de preços.

¿Substitui o sabão Omo pelo Surf, que é mais barato, e já comprei três caixas para aproveitar o preço. O que está mais barato eu levo mesmo¿, conta. Diante da alta do preço do arroz, ela decidiu experimentar uma marca nova. ¿A promotora disse que esse arroz dobra de volume depois de pronto.¿

A dona de casa Ana Néri Martim de Araújo, de 38 anos, casada e mãe de dois filhos, diz que só compra os produtos nos supermercados orientada pelos preços. Com renda familiar de R$ 600 por mês, ela diz que não faz estoques de produtos no momento atual porque ¿não tem dinheiro¿.

Para driblar a inflação, ela garimpa ofertas indo mais vezes ao supermercado, cada vez em uma rede diferente, na busca do menor preço.

RISCO

Apesar da maior racionalidade do consumidor, Moreira considera que o repique atual dos preços dos alimentos tem potencial de risco maior do que no passado. Ele lembra que a estrutura de gastos do brasileiro mudou.Com a incorporação de novos gastos, como TV a cabo, conta de celular e crediário, que naquela época era incipiente, a alta dos alimentos pode causar aumento da inadimplência de outros compromissos.

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