Título: Demanda forte já pressiona os serviços
Autor: Chiara, Márcia De
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/06/2008, Economia, p. B4

Preços disparam 6,25% em 12 meses; situação é crítica, diz analista

O brasileiro enfrenta hoje uma segunda onda inflacionária, que vai além dos preços dos alimentos e do petróleo. Desde meados de maio, os preços dos serviços livres, aqueles regulados pela disposição do consumidor de pagar mais pelo corte de cabelo, conserto do sapato, reparo no domicílio, entre outros, dispararam. ¿A situação é crítica porque a segunda onda inflacionária, que é a dos serviços, já chegou sem ter ido embora a primeira, a dos alimentos¿, afirma Fábio Silveira, sócio da RC Consultores.

Os preços dos serviços livres, que aumentavam, em média, entre 0,30% e 0,40% ao mês, saltaram para uma faixa de reajustes mensais superiores a 0,80% desde o fim do mês passado, segundo cálculos da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

Em 12 meses até a segunda quadrissemana de junho, os serviços livres acumulam alta de 6,25%, ante variação do IPC geral de 5,71%. Eles só perdem para as elevações dos preços dos produtos comercializáveis, que aumentaram 8,33% no período, puxados especialmente pelos alimentos.

O campeão de alta dos serviços nos últimos 30 dias encerrados em 15 de junho foi reparo no domicílio, que inclui serviços de pedreiro, encanador e eletricista, por exemplo. Os preços desses serviços subiram 3,82% nesse período, mais que o triplo da inflação geral medida pelo IPC-Fipe, de 1,26% na segunda quadrissemana deste mês.

Essa também foi a maior taxa registrada para os reparos no domicílio desde dezembro de 2002, quando chegou a 3,83%. Em 12 meses, esses serviços acumulam alta de 15,2%. Gastos com refeição fora de casa (2,17%), sapateiro (1,24%), lavagem de veículo (1%) e psicólogo (2%) também estão no rol dos serviços livres que mais subiram nos últimos 30 dias, de acordo com o IPC-Fipe.

¿Recentemente, os preços dos serviços livres deram uma acelerada e mudaram de patamar¿, afirma o coordenador do IPC-Fipe, Marcio Nakane. De acordo com ele, ainda é cedo para dizer se a aceleração dos preços dos serviços é uma tendência. De toda forma, é um indicador de inflação de demanda, afirma.

ALIMENTOS

Para Silveira, da RC Consultores, o principal fator da disparada da inflação vem ainda de fora, com a elevação dos preços dos alimentos. ¿É um vírus que contamina o mundo todo¿, diz. E, nesse sentido, não há trégua. Um índice de preços das commodities elaborado pela consultoria mostra que as cotações desses produtos, agrícolas e não agrícolas, cresceram 1,8% neste mês, retomando o ritmo de aumentos de abril.

O maior fator de pressão de preços das commodities foi o alimento, que ficou 2,7% mais caro neste mês, após ter subido 0,7% em maio. No caso das commodities não agrícolas, que, além do petróleo, incluem ouro, alumínio, minério de ferro, zinco, entre outros, a elevação atingiu 1,2% em junho.

¿O que incomoda é que a primeira onda inflacionária, provocada pelos alimentos, não dá indicações de que irá embora tão cedo¿, observa Silveira. Ele lembra que o cenário se deteriorou um pouco mais depois das enchentes que atingiram na semana passada as lavouras do meio-oeste dos Estados Unidos, a principal região produtora de grãos no país, e das previsões mais apertadas para a safra 2008/2009 divulgadas pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda, na sigla em inglês).

Além da perspectiva de quebra de safra, as medidas protecionistas adotadas pelos governos da Argentina e do México para garantir o abastecimento local só estão dando ainda mais força para o aumento de preços dos alimentos.

INDEXAÇÃO

Silveira destaca que essa segunda onda inflacionária, marcada pela elevação dos preços dos serviços, ganha força porque no Brasil há mecanismos de indexação que não foram desativados. ¿Vários contratos são reajustados pelos IGPs, como os aluguéis¿, observa.

Os Índices Gerais de Preços (IGPs), que têm forte influência dos preços no atacado, atingiram nos últimos 12 meses a casa de dois dígitos. Na segunda prévia do IGP-M de junho, a alta acumulada em 12 meses foi de 13,27%.

¿Essa reindexação só tem efeito porque a economia está razoavelmente aquecida¿, diz Silveira. O rendimento médio nominal está crescendo a uma taxa de 7% a 8%, superior à inflação. A demanda, sustentada pelos aumentos dos salários, acaba alimentando novamente o aumento dos preços.

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