Título: Está chegando a hora de mudar a Lei Rouanet
Autor: Pennafort, Roberta
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/08/2008, Nacional, p. A15

Sucessor diz que Gil foi o melhor ministro da Cultura da história e que transição já vinha sendo feita, ¿de baiano para baiano¿

Sucessor de Gilberto Gil no Ministério da Cultura, Juca Ferreira está acostumado a ser chamado de ministro. Já representou Gil muitas vezes, no Brasil e no exterior. Desde a posse do amigo, em 2003, Juca sempre foi considerado o ¿xerife¿ da pasta, na condição de seu secretário-executivo. Prestes a ser confirmado no cargo, o que deve ocorrer, segundo ele próprio, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltar de Pequim (para onde viaja, na semana que vem, por conta da abertura das Olimpíadas), Juca disse ontem ao Estado que Gil foi o melhor ministro da Cultura da história, e que a transição já vinha sendo feita lentamente, ¿de baiano para baiano¿.

Quais serão as prioridades de sua gestão?

Primeiro, manter o movimento em direção à estruturação e à execução de políticas públicas de cultura em todas as áreas, no espectro que o ministro abriu. Segundo, a área das artes. A Funarte (Fundação Nacional de Artes) foi a que mais sofreu com a intervenção que o (ex-presidente Fernando) Collor de Mello fez na área cultural. Foi um escândalo. Demoramos muito a compreender a profundidade (do problema). Outra área é a decantada reforma da Lei Rouanet. Está chegando a hora. E a modernização das leis de direitos autorais no Brasil. Na área do patrimônio, estamos às vésperas de criar o Instituto Brasileiro de Museus.

E o Plano Nacional de Cultura?

Estamos discutindo publicamente o plano, que é importantíssimo e vai dar institucionalidade ao ministério. Toda política pública respeitável no Brasil tem um plano nacional. Estamos fazendo audiências públicas em todo o Brasil. Lá para meados do primeiro semestre (de 2009) vamos ter um Plano Nacional de Cultura, como primeira pactuação da estratégia geral de cultura.

Em sua opinião, quais foram os maiores acertos e erros da gestão de Gil?

O ministério, em todos os aspectos que você considerar, é muito melhor do que o que a gente encontrou. Em alguns aspectos a gente avançou mais e em outros, menos. A compreensão de que cultura é uma necessidade tão básica quanto comida, saúde e educação e, portanto, precisa de política pública, foi uma grandeza, uma lucidez. Na área de patrimônio e memória, a gente avançou, na área de museus, de cinema - conseguimos fazer em torno de 400 filmes de longa-metragem nesse período. Agora, erros se cometem; cometemos alguns.

Que avaliação faz sobre a Lei Rouanet como está?

A gente não pode ter a renúncia fiscal como critério principal para financiar a cultura brasileira. É um mecanismo que serve para algumas ações. Tem de ter o Orçamento, os mecanismos de mercado. Queremos introduzir o vale-cultura, semelhante ao vale-refeição, e reestruturar os mecanismos de uso da renúncia. O ministério está preparado para botar na rua a discussão.

Como reage aos críticos da lei?

Não dá para desestruturar um mecanismo que, com todas as distorções que a gente possa considerar, disponibilizou, no ano passado, R$ 1 bilhão. Eu não sou maluco. A substituição seria por mais Orçamento, então dependemos da sensibilidade do governo para mudar o modelo. As Nações Unidas recomendam no mínimo 1% do Orçamento. O que a gente precisa para aplicar o planejamento da política cultural já estabelecida é de R$ 3,7 bilhões, o que dá perto de 3%. A visibilidade que o Gil deu ao ministério ajuda muito. Em todas as áreas você percebe a presença do ministério de forma positiva.

O tempo todo o senhor enfatiza o papel de Gil e o coloca como o melhor ministro da Cultura que já existiu. Por quê?

Não só eu, mas todo mundo. O (Sérgio Paulo) Rouanet, que foi um dos ministros da Cultura, disse, na comemoração do aniversário do ministério, que Gil tinha fundado o ministério. Ele reconhecia que tinha sido dado um salto monstruoso nesta gestão. É inquestionável. Gil foi um gigante.

Como o senhor analisa as críticas que o ministério e o ex-ministro sofreram nestes anos (dirigismo na área cultural, viagens como artista, lentidão na liberação de pareceres para obtenção de patrocínios)?

A questão do dirigismo foi uma bobagem. Acho que a gente deve usar as palavras com precisão. O que nós queríamos era regular a economia da cultura, e não as opiniões. A questão das viagens de Gil... O ministério é ultrabem-sucedido. Ele montou um sistema de gestão moderno, um colegiado de dirigentes. Eu fui designado para representá-lo em sua ausência. Os celulares existem para isso. Funcionamos muito bem, melhor do que os ficaram o tempo inteiro sentados na cadeira. Quanto aos pareceres, o ministério cresceu muito e o número de pareceres passou de 3 mil para quase 30 mil. É difícil manter a eficiência com a mesma estrutura que existia antes.