Título: Abin completa dez anos sob frágil fiscalização do Congresso
Autor: Tosta, Wilson
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2009, Nacional, p. A14

Comissão de controle não tem lei própria nem infraestrutura para trabalhar

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) completou dez anos na semana passada sem que a Comissão de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional, encarregada de fiscalizá-la, tivesse lei regulamentando sua atuação, nem funcionários ou mesmo sala própria para trabalhar. A falta de meios legais e materiais fragiliza a atuação do órgão fiscalizador, formado por senadores e deputados e com reuniões intermitentes, admite o deputado Severiano Alves (PMDB-BA), ex-presidente da comissão.

O deputado propôs em agosto uma emenda à Constituição criando um novo conselho para controlar a agência, com participação dos três Poderes, paralelamente à comissão. Os serviços secretos são tabu no Brasil, onde têm a imagem associada ao Serviço Nacional de Informações (SNI), organismo repressor da ditadura, criado em 1964 e extinto em 1990.

"O grande problema é a ignorância do povo brasileiro e de grande parte do parlamento que não sabem o que é inteligência", lamenta Alves, que, por ter trocado o PDT pelo PMDB, perdeu a presidência da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados.

Desde sua criação, a Abin já passou por várias crises, tendo sofrido disputas internas de grupos rivais, conflitos com a Polícia Federal e acusações de atuação política. A mais recente envolveu a participação supostamente irregular de seus agentes na Operação Satiagraha da PF, que investigou o banqueiro Daniel Dantas, em 2008. O escândalo custou o cargo de diretor-geral da agência, o delegado federal Paulo Lacerda.

A existência de uma comissão mista do Congresso para fiscalizar a Abin é fixada na lei 9.883, de 1999, que a criou. A comissão foi instalada em novembro de 2000 e, desde então, não se reuniu com muita regularidade. "É por espasmo", diz outro ex-presidente da comissão, o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). "Se tem uma crise na espionagem, a comissão se reúne." Autor dos dois projetos de regulamentação, Hauly acha fundamental uma lei para a comissão. "Aprovado o projeto, a fiscalização vai se tornar orgânica, definitiva. É preciso exercer o controle democrático externo do Sistema Brasileiro de Inteligência", defende.

O deputado diz que faltou maturidade às Mesas do Senado e da Câmara para aprovar o seu primeiro projeto de regulamentação da comissão, o PRN-8/2001. Ao longo de anos, a comissão se reuniu sem um texto legal que embasasse suas ações e poderes para, por exemplo, obrigar diretores da Abin a prestar informações e estabelecendo punições para o vazamento de informações sigilosas. "Com o Severiano (Alves) na presidência, este ano, ele retomou o tema", diz Hauly, que conta que o então presidente reapresentou o projeto, agora o PRN-2/2008. A proposta está em tramitação e tem como relator o deputado Marco Maia (PT-RS), que prepara um substitutivo.

Alves e Hauly concordam que um dos problemas da comissão com sua composição atual é a dificuldade para compatibilizar as agendas de seus membros. A Lei 9.883/99 determina que sejam integrantes da comissão os líderes da maioria e da minoria na Câmara e no Senado e os presidentes das Comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional nas duas Casas. "Esses líderes são muito ocupados. Não têm tempo para nada, são tomados por tarefas e reuniões", afirma Hauly.

"A inteligência passou ao segundo plano", diz Alves. Para ele, o projeto de Hauly não andou porque faltou interesse político, interesse pela causa e mesmo conhecimento do assunto.

"Pegamos o projeto original do Hauly, fizemos nova minuta, o Hauly gostou, e apresentamos", conta Alves, que reclama da precariedade de meios da comissão. "Os Estados Unidos têm 200 técnicos para auxiliar os deputados. Aqui, não temos nenhum. Temos um consultor legislativo do Senado e um consultor da Mesa. Eu pegava o meu pessoal, o pessoal da Comissão de Relações Exteriores, para ajudar. Não tínhamos secretaria, nem espaço. Nem pessoal de apoio". O relator do projeto conta que vai acrescentar ao texto original apenas alguns pontos, relativos à segurança da informação colhida pela comissão. "Temos que fazer uma comissão que controle a Abin e, ao mesmo tempo, não seja um vazadouro de informações sigilosas", diz Maia. Ele conversou com o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ao qual a agência se subordina, com a própria Abin e com o Ministério da Defesa. Espera concluir o substitutivo em dezembro de 2010, para encaminhá-lo à Mesa Diretora da Câmara.