Título: Desafios do mundo são muito maiores
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/01/2010, Economia, p. B4

Em discurso lido por Amorim, Lula pede mudança global

O mundo enfrenta hoje desafios "muito maiores do que os enfrentados pelo Brasil", disse o presidente Lula no discurso de agradecimento pelo título de Estadista Global conferido pelo Fórum Econômico Mundial, lido pelo chanceler Celso Amorim. "Com mudanças de prioridades e rearranjos de modelos, o governo brasileiro está conseguindo impor um novo ritmo de desenvolvimento ao País." Amorim representou o presidente, retido no Brasil por uma crise de hipertensão, e recebeu o troféu do ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan. Foi a primeira vez que o prêmio foi concedido.

Lula conheceu Davos em janeiro de 2003, logo depois de iniciar seu primeiro mandato. Foi recebido com demonstrações de simpatia pelo público do Fórum Econômico Mundial e também com muita curiosidade. "O mundo temia pelo futuro do Brasil, porque não sabia o rumo exato que nosso país tomaria sob a liderança de um operário, sem diploma universitário, nascido politicamente no seio da esquerda radical", disse Lula no discurso de ontem. Lembrou também os compromissos anunciados na ocasião, como o de trabalhar para reduzir as disparidades econômicas e sociais, e a proposta de "construção de uma nova ordem econômica internacional, mais justa e democrática".

O que aconteceu no mundo nos últimos sete anos?, perguntou Lula. "Podemos dizer que o mundo, igual ao Brasil, também melhorou?" Essas perguntas foram seguidas de uma lista de outras, a respeito das guerras, da pobreza, das desigualdades e da degradação do ambiente. Respostas: o mundo não melhorou, as tragédias continuaram e a tudo isso se acrescentou o desastre provocado pela especulação financeira. Lula aproveitou para mostrar adesão às bandeiras ambientalistas: "Quantos graus de aquecimento global, quanto degelo, quanto desmatamento e desequilíbrios ecológicos serão necessários para que tomemos a firme decisão de salvar o planeta?"

Pelo menos o Brasil, segundo o discurso, tem sido salvo. Lula enumerou realizações de seu governo, como a inclusão de 31 milhões de brasileiros na classe média, a retirada de 20 milhões da pobreza absoluta, a acumulação de reservas - de US$ 38 bilhões para cerca de US$ 240 bilhões - e a transformação do Brasil num país capaz de enfrentar uma crise como a dos últimos anos. "Pagamos toda a nossa dívida externa", afirmou Lula, incorrendo num exagero. O País tem reservas maiores que a dívida, e, portanto, a dívida líquida é negativa em termos contábeis. Mas isso é uma abstração. Do ponto de vista dos credores, ainda há um bom dinheiro a ser pago.

O discurso foi concluído com um novo apelo a favor de reformas globais no sistema financeiro, na ordem econômica e no tratamento do ambiente. "Precisamos de um novo papel para os governos", disse Lula. "E digo que, paradoxalmente, este novo papel é o mais antigo deles: é a recuperação do papel de governar." Kofi Annan fez um breve elogio de Lula antes de entregar o prêmio a Celso Amorim. "Os pobres do mundo", disse o ex-secretário-geral da ONU, "ganharam um novo e poderoso campeão".