Título: Remessa pode superar IED pela 1ª vez
Autor: Assis, Francisco Carlos de
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/07/2010, Economia, p. B7

Projeção negativa para o Brasil neste ano consta do Relatório Mundial de Investimentos apresentado pela Unctad e Sobeet

As perspectivas para o Investimento Estrangeiro Direto (IED) no Brasil nos próximos anos não são das melhores. Segundo o presidente do conselho da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet, Herman Wever, é provável que as remessas de lucros e dividendos superem o ingresso de IED em 2010 pela primeira vez na história brasileira.

De acordo com as expectativas da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) e da Sobeet, que apresentaram ontem, o Relatório Mundial de Investimentos, as remessas de lucros e dividendos neste ano deverão somar entre US$ 32 bilhões e US$ 35 bilhões, e a expectativa de ingresso de IED no País é de US$ 30 bilhões. "Isso deixa um quadro de piora na relação IED/transações em conta corrente", disse Wever.

No ano passado, comparativamente a 2008, o Brasil já havia caído da 10.ª para a 14.ª posição entre as 20 economias que mais receberam investimento estrangeiro no mundo. De acordo com o estudo, os motivos que levaram à queda no ingresso de IED em 2009, e que sustentam as expectativas negativas para os próximos anos, são de caráter conjuntural e estrutural.

Os dois lados. Do ponto de vista conjuntural, a diminuição do fluxo de IED no Brasil está relacionada à crise financeira internacional, mas há também o problema com o câmbio e a elevada carga tributária. O real valorizado tem estimulado o aumento de remessas de lucros e dividendos das empresas para suas matrizes, o que acaba impactando negativamente na balança de pagamentos e encarecendo os investimentos no País.

Do ponto de vista estrutural, entre vários exemplos, a Sobeet cita a ausência do Brasil no conjunto de países que, nos últimos dez anos, assinou tratados de investimento. Nesse período, foram assinados no mundo 1.004 tratados, dos quais o Brasil não assinou nenhum, assim como apenas 19 dos 177 países da amostra da Unctad.

Para Wever, isso faz muito mal para a economia porque os tratados de investimento, entre outras funções, protegem os investimentos estrangeiros, tanto de empresas estrangeiras no Brasil quanto de brasileiras no exterior. "O Brasil não só deixou de assinar tratados nos últimos dez anos como perdeu um que mantinha com a Alemanha", afirmou.

De acordo com o presidente da Sobeet, Luís Afonso Lima, a entidade tem conversado com o Itamaraty sobre essa questão. A justificativa, ainda que não oficial, é que o Brasil é um recebedor líquido de investimentos, e que, nesse caso, teria mais que proteger investimentos estrangeiros do que ter seus investimentos protegidos no exterior.

O problema, segundo Antônio Corrêa de Lacerda, membro do conselho da Sobeet e professor de Departamento de Economia da PUC-SP, é que boa parte dos investimentos brasileiros no exterior são de caráter governamental ou de capital misto, ou seja, trata-se de dinheiro público sem proteção no exterior. Ele citou, por exemplo, os problemas enfrentados pela Petrobrás na Bolívia e pela Odebrecht no Equador.

Apesar das perspectivas ruins para o Brasil, pesquisa feita pela Unctad em 2010 mostra que o País saltou da 4.ª para a 3.ª posição no ranking dos países mais citados para a entrada de IED até 2012, atrás de China e Índia, e à frente de Estados Unidos, Rússia e México. No entanto, de acordo com a Sobeet, os dados da pesquisa não devem ser concretizados com facilidade, uma vez que os investidores estrangeiros têm preferido outros destinos para seus recursos, dada a falta de segurança no País.

Cenário ruim

42,4% foi o recuo do Investimento Estrangeiro Direto (IED) em 2009 no Brasil em relação a 2008

41,2% foi o recuo do IED nas economias desenvolvidas em relação a 2008, segundo dados de relatório da Unctad e da Sobeet