Título: Manifestantes se surpreendem com rapidez da queda
Autor: Sant"Anna, Lourival
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2011, Internacional, p. A12/20

CAIRO - Ayman Emam e sua família estavam fazendo a oração das 18 horas na Praça Tahrir, no centro do Cairo, quando começaram a ouvir os gritos de que Hosni Mubarak tinha renunciado. Em seguida seus celulares começaram a tocar. Eram parentes que estavam em casa, ligando para dar a notícia. Eles não acreditavam no que ouviam.

"Pensei que isso ainda ia levar mais uma semana e que poderia haver tumulto e derramamento de sangue", disse Emam, de 46 anos, executivo de recursos humanos de uma multinacional. "Estamos muito orgulhosos de ser egípcios", disseram suas sobrinhas e seu filho adolescentes. Eles contaram que se sentem "orgulhosos" de ter mudado o destino do Egito e que se sentem "acima da Lua". "Mudamos nosso destino. Foi uma conquista da nossa geração."

A mulher do executivo, Mamany, lembrou de um grupo de mulheres "muito pobres, provavelmente analfabetas", que pulava de alegria. Foi o que mais chamou a atenção de sua família. "Começamos a filmá-las com os celulares."

Emam afirmou que confia no propósito do Exército de organizar a transição para a democracia e não perpetuar-se no poder. "Sei que não será fácil, que há muitos grupos de interesse, mas tenho esperança na democracia e em melhores condições de vida para os egípcios."

A secretária executiva Salwa Hosni, de 58 anos, havia chegado às 16 horas à Praça Tahrir, acreditando que teria pela frente uma longa espera até a queda de Mubarak, depois do decepcionante pronunciamento da noite anterior. "Achamos que fosse levar muito tempo", disse, tremulando uma bandeira do Egito na brisa do Rio Nilo. Salwa afirmou não ter candidato a presidente. "Não confiamos em ninguém", contou.

O estudante de engenharia Hany Shiha, de 23 anos, e o farmacêutico Gamal Osama, de 26, empunhavam uma bandeira na beira do rio, abraçados. "Estou cansado e feliz", afirmou Shiha, que há duas semanas protestava na praça pela saída de Mubarak. "Não consigo expressar tudo o que estou sentindo." O estudante contou que, se tiver chance, votará em Mohamed ElBaradei para presidente. "Ele apoiou as manifestações desde o primeiro dia. Veio aqui e ficou do lado do Egito."

"Estou feliz e ao mesmo tempo preocupado", contou Osama, que atualmente tenta abrir sua própria farmácia. "Mubarak não pode simplesmente dizer adeus e ir embora com sua fortuna de US$ 70 bilhões. Queremos que ele seja julgado e queremos esse dinheiro, que é nosso, para construir casas, criar empregos, investir no Egito."

Osama disse não se importar muito com quem será o próximo presidente. Considera mais importante que uma nova Constituição seja escrita para que instituições democráticas sejam criadas. "Não podemos mais ter um líder a cargo de tudo, exibindo seu poder ilimitado. Precisamos de funções delimitadas e de distribuição do poder."