Título: BRF abre leque de negociação no Cade
Autor: Friedlander, David ; Landim, Raquel
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2011, Economia, p. B1

Em entrevista ao Estado, presidente da Brasil Foods muda o discurso e não rejeita sequer discutir a venda das marcas Sadia e Perdigão

O presidente da Brasil Foods (BRF), José Antônio do Prado Fay, corre contra o tempo. Ele tem cerca de 50 dias para virar o jogo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e aprovar a união da Sadia com a Perdigão, que deu origem à BRF. O processo, que se arrasta há dois anos, tornou-se muito desfavorável para a empresa depois que o conselheiro Carlos Ragazzo, relator do caso, reprovou a fusão na quarta feira.

Fay afirma que vai trabalhar para mudar a imagem de inflexível que pode ter deixado no órgão antitruste e está "aberto à negociação" para chegar a um acordo com o Cade. É uma mudança e tanto no discurso do executivo. Até o baque com o voto de Ragazzo, ele não admitia nem conversar sobre a hipótese de vender as marcas Sadia ou Perdigão. Ontem, ao ouvir a pergunta novamente na entrevista ao Estado, não disse sim nem não, desconversou. "Não estou afirmando que descarto ou não descarto. O que estou dizendo é: eu não quero", afirmou.

O presidente da BRF diz que vai participar do corpo a corpo com os conselheiros, até agora entregue aos advogados e executivos da empresa. O julgamento foi interrompido na quarta-feira depois que o conselheiro Ricardo Ruiz pediu vista do processo, mas deve ser retomado em breve. O trabalho de convencimento começa segunda-feira, com encontro com o próprio Ruiz.

Fay acha que precisa explicar melhor ao Cade o dia a dia do negócio, na tentativa de fugir da discussão em torno de modelos matemáticos usados para inferir cenários de aumento de preços e concentração de mercado. "Não quero mais esse diálogo econometrista. Estou falando o ponto de vista de alguém que trabalha no setor há 30 anos."

O relator afirmou, por exemplo, que a concentração de mercado liberaria a empresa para esfolar a clientela, com aumentos de até 40% nos preços de alguns produtos. Fay precisa convencer os colegas de Ragazzo que o perigo não existe. "Aumento de 40% não existe. Se fizer isso, o consumidor não compra mais meu produto. Nem a Petrobrás, que é monopolista, consegue impor uma coisa dessas."

Ele estava em Brasília na quarta-feira, mas não ficou na cidade para acompanhar o início do julgamento no Cade. Saíra de um encontro com o relator, no dia anterior, já sabendo que as coisas seriam difíceis. Ontem, dizendo-se cansado, Fay, um sujeito normalmente tranquilo, estava inquieto e chegou a ficar com a voz embargada e os olhos marejados quando afirmou que "a Brasil Foods é boa para o Brasil" e que "não vai maltratar os consumidores".

A tarefa do presidente da Brasil Foods não será fácil. Advogados especializados em defesa da concorrência dizem que apenas uma proposta de acordo surpreendente, envolvendo o descarte das marcas Sadia ou Perdigão poderá demover o Cade de reprovar a fusão.