Título: Mercado antecipa queda forte da Selic
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/08/2011, Economia, p. B6

Em grande reviravolta em apenas um mês, em função da crise global, contratos futuros de juros apontam taxa básica de 11% em janeiro

RIO - As projeções quase unânimes para a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) na terça e na quarta-feira são de que a Selic, a taxa básica de juros, seja mantida no atual nível de 12,5%. Mas as taxas de juros do mercado futuro indicam que a Selic vai ser reduzida, a partir da reunião do Copom de outubro, em 1,5 ponto porcentual, caindo para 11% até meados de janeiro de 2012.

Atrelado aos desdobramentos da crise internacional, esse novo cenário para as taxas de juros brasileiras representa uma grande reviravolta em relação ao que prevalecia há cerca de um mês. Os contratos futuros de juros de um ano tiveram uma queda abrupta de 12,58% para 11,36% de 29 de julho até a sexta-feira. Em 8 de julho, eles estavam em 12,69%, 1,3 ponto porcentual acima do fechamento da sexta.

Na verdade, a queda da Selic implícita nos contratos futuros ainda não aparece nas projeções da taxa básica, feitas por bancos e consultorias, e coletadas regularmente pelo Banco Central (BC). A mediana das previsões ainda é de que a taxa de 12,5% seja mantida até o final de 2012.

Esse descompasso entre o que preveem analistas e as apostas dos operadores no mercado futuro não são incomuns, especialmente em momentos de grande virada da conjuntura econômica, como atualmente.

"A diferença é que o economista é mais cauteloso, enquanto um operador prefere apostar imediatamente quando surge uma probabilidade mais forte de uma nova tendência", explica um ex-diretor do Banco Central (BC). Por outro lado, diz, as taxas implícitas nos contratos futuros oscilam, ao sabor dos humores do mercado, bem mais do que as projeções dos analistas.

A explicação básica para a reviravolta nas expectativas dos juros é que a economia brasileira, já em processo de desaquecimento, receberá uma freada adicional do resfriamento global na esteira do mau desempenho de Estados Unidos e Europa.

A piora da perspectiva de crescimento no Brasil já aparece nas projeções de bancos e consultorias. No início de fevereiro, a mediana das expectativas para 2011 e 2012 era de expansão do PIB de 4,5%. No começo de junho, essas projeções já haviam caído para, respectivamente, 4% e 4,1%. Na última divulgação de previsões, colhidas em 19 de agosto, já eram de 3,84% e 4%.

Esses números, porém, devem cair ainda mais, já que há um movimento geral de revisão para baixo de projeções de crescimento. A dúvida agora parece ser se o crescimento neste e no próximo ano ficará entre 3,5% e 4% ou entre 3% e 3,5%. O Banco UBS, por exemplo, prevê 3,1% em 2011 e 3,6% em 2012.

Há sinais concretos de desaceleração, como a queda de 1,3% da produção industrial de junho e o índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que busca antecipar o PIB, e que registrou, pela primeira vez em 30 meses, uma queda de 0,26% no mesmo mês.

A combinação de vento contra interno e externo, após um período de grande aquecimento da economia, é vista por alguns analistas como uma oportunidade histórica para se derrubar a Selic para níveis menos discrepantes com o resto dos países. A condição, porém, seria manter ou mesmo acentuar a atual fase de política fiscal menos expansionista, prolongando-a em 2012.

Conjuntura

"Acho que a crise internacional salvou o governo, não só do lado econômico, mas também político", diz o economista Alexandre Marinis, da consultoria Mosaico Economia Política. Para ele, sem o esfriamento global, o BC ficaria sobrecarregado e teria de elevar ainda mais a Selic para conter a inflação.

"Agora, o governo tem uma conjuntura ímpar, um momento-chave, para fazer a coisa certa e, de fato, acelerar a convergência brasileira para padrões internacionais (de juros)", diz. Para Marinis, esse processo não será concluído no atual mandato da presidente Dilma Rousseff, mas pode nele se iniciar. Ele também acha que, com a crise internacional, Dilma terá mais capacidade de conter as demandas de aumento de gastos do Congresso.

Mas o economista acha fundamental que o governo dê mais sinais concretos de compromisso fiscal, como, por exemplo, fazer um superávit primário em 2011 superior à meta (em torno de 3% do PIB). "Acho que dá para chegar a 3,2%", diz.