Título: Venezuela constrói drone com ajuda do Irã
Autor: Raatz, Luiz
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/06/2012, Internacional, p. A18

Washington diz que analisará se houve violação às sanções internacionais a Teerã

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, apresentou na noite de quarta-feira um modelo de avião não tripulado (drone) fabricado no país com auxílio iraniano. O líder bolivariano anunciou ainda avanços na construção de uma fábrica de armas e munição em parceria com a Rússia. Ontem, o governo americano expressou preocupação com a cooperação entre Teerã e Caracas.

Em um discurso de mais de três horas, em pé e fardado, Chávez anunciou também investimentos em infraestrutura e equipamento para as Forças Armadas. Segundo o presidente, o anúncio foi uma resposta a uma investigação do governo americano sobre os drones, noticiada pelo jornal espanhol ABC.

"Ontem saiu na imprensa internacional que em Nova York há uma investigação sobre a fábrica de pólvora e de aviões não tripulados", disse o presidente. "Claro que estamos fazendo as duas. Temos o direito de fazê-las."

Os aviões, batizados de Arpía, têm um raio de ação de 100 quilômetros, com autonomia de voo de 90 minutos e podem viajar a uma altitude de 3 mil metros. De acordo com autoridades chavistas, o avião foi fabricado com peças venezuelanas por engenheiros treinados no Irã.

Segundo Chávez, as aeronaves terão funções de patrulhamento. "Esse avião possui uma câmera e tem propósitos defensivos, tanto militares quanto civis", garantiu. "Não temos planos de agredir ninguém, mas que não se enganem conosco. Vamos defender a independência do país com nossa própria vida."

Ontem, o Departamento de Estado dos EUA criticou o anúncio do líder bolivariano. "Os venezuelanos, assim como os iranianos, fazem declarações extravagantes", disse a porta-voz Victoria Nuland. "Nossa principal preocupação é a violação das sanções internacionais contra o Irã. Monitoraremos isso de perto."

Na fábrica de armas e munições de Maracay, no Estado de Aragua, já foram fabricados 3 mil fuzis AK-103 com apoio russo, 200 granadas e fuzis Catatumbo - um projeto local. O presidente da Companhia Venezuelana de Indústrias Militares (Cavim), general Julio César Morales Prieto, estima que a fábrica está 60% pronta e, em pleno funcionamento, produzirá 25 mil fuzis e 70 milhões de projéteis ao ano.

Com uma retórica antiamericana, Chávez criticou os EUA e celebrou a parceria com países como China, Rússia, Cuba e Irã. "Somos um país livre e independente. Os ianques não mandam aqui", declarou. O presidente ainda confirmou a visita do iraniano Mahmoud Ahmadinejad ao país depois da Rio+20.

No ano passado, o governo venezuelano obteve um empréstimo de US$ 4 bilhões para adquirir armas russas. Desde 2005, Caracas já investiu US$ 5 bilhões em equipamento militar russo. Chávez também comprou aviões militares da China.

Campanha. Na cerimônia de quarta-feira, Chávez vinculou uma vitória da oposição nas eleições de outubro ao fim da independência do país. Ele também disse haver setores antichavistas interessados em dividir as Forças Armadas e os venezuelanos. "Nem pensem nisso. O poder que temos hoje é 20 vezes maior do que tínhamos em 2002 (quando sofreu um malsucedido golpe de Estado)", afirmou.

Para o analista político venezuelano Carlos Romero, a cerimônia chavista tinha três objetivos. Primeiro, mostrar que Chávez mantém o controle sobre as Forças Armadas. Segundo, reafirmar a ideia de que a Venezuela precisa se defender de um suposto inimigo externo. E, finalmente, diz o especialista, o presidente aproveitou para criticar a oposição antes do início oficial da campanha eleitoral venezuelana, dia 1.º.

"Ele tentou garantir que controla as Forças Armadas e tem boas relações com países como China, Rússia e Irã no marco de sua política antiocidental", disse o analista ao Estado. "Tudo isso faz parte de uma espécie de doutrina que ele pretende utilizar na campanha eleitoral."

Chávez, que se recupera de um câncer, inscreveu sua candidatura na segunda-feira. O candidato da oposição em outubro será o governador de Miranda, Henrique Capriles. / COM REUTERS