Título: Vieira promete divulgar dados bancários
Autor: Macedo, Fausto ; Boghossian, Bruno
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/01/2013, Nacional, p. A6

Acusado na Operação Porto Seguro de integrar uma qua­drilha que favorecia empresas privadas dentro de órgãos do governo federal, o ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Vieira promete divulgar seus extratos bancá­rios dos últimos cinco anos pa­ra tentar provar que não rece­beu propina ou outros benefí­cios ao ocupar cargos públi­cos. Ele afirma que vai publi­car os documentos na inter­net para provar sua inocência.

Vieira admite ter entrado em contato com autoridades para tratar de processos que estariam travados pela burocracia de ór­gãos públicos, mas alega que não praticou nenhum ato ilegal na emissão de pareceres que viriam a beneficiar empresas portuá­rias - centro da investigação fei­ta pela Polícia Federal.

Ele diz que não houve corrup­ção, crime do qual é acusado, pois fez manifestações oficiais aos órgãos públicos envolvidos no esquema, como a Advocacia- Geral da União (AGU) e a Agên­cia Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

O ex-diretor da ANA afirma que não recebeu dinheiro de ne­nhuma empresa e que não ofere­ceu vantagens a servidores públi­cos. Diz que fez articulações nos órgãos públicos por motivação política - ele é aliado do ex-sena­dor Gilberto Miranda e do depu­tado Valdemar Gosta Neto (PR), e pretende ser candidato a depu­tado federal pelo PT em 2014.

Vieira apresentou ao Estado os extratos de uma conta no Ban­co do Brasil, que diz ser a única que possui. Ele imprimiu os docu­mentos na agência que fica no pré­dio onde está instalado o gabinete da Presidência da República em São Paulo - espaço onde ele costu­mava se encontrar com a chefe de gabinete Rosemary Noronha, também acusada de corrupção.

Os papéis do mês de outubro, por exemplo, um mês antes da de­flagração da operação, reprodu­zem os depósitos de seus salários (R$ 6.967,68 do Ministério da Fa­zenda, onde é funcionário de car­reira, e R$ 4.022,25 da ANA), no dia 1.°. Há também um saque de R$ 18 mil, no dia 5, e pagamentos de assinaturas de jornais, refei­ções e em lojas de roupas.

Os extratos também mostram que, todos os meses, Vieira tem descontados de sua conta R$ 333,09 referentes à mensalidade que o PT cobra dos filiados ao partido que trabalham em car­gos de confiança.

Não aparecem nas movimenta­ções bancárias de Vieira no Ban­co do Brasil os recursos obtidos pela Faculdade de Ciências Hu­manas de Cruzeiro (Facic), con­trolada por uma fundação regis­trada em nome de sua mulher. Na conta da instituição, estão de­positados R$ 989 mil, segundo a Justiça Federal. A conta foi blo­queada após a deflagração da ope­ração, em 23 de novembro, e libe­rada no fim de dezembro.

Nas anotações que fez quando esteve preso, entre 23 e 30 de no­vembro, Vieira relatou a evolução dos lucros da faculdade, criada em 2006, a fim de se defender de suspeitas de lavagem de dinheiro. "Em 2012 - a faculdade chegou a perto (de) 3.000 alunos e lucros próximos a R$ 250 mil", anotou. Vieira afirma que divide o dinhei­ro com outros nove professores.

Defesa. Na defesa que vai apre­sentar à Justiça Federal para re­bater as acusações, Vieira quer desqualificar o principal trunfo da denúncia: Cyonil Borges, ex-auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) que delatou à Polícia Federal e à Procuradoria da República o suposto esquema de compra e venda de pareceres técnicos em órgãos públicos.

"Ele (Cyonil) sempre me pedia favores, empregos para parentes e ajuda financeira ", afirma Vieira, a quem a Procuradoria atribui prá­tica de cinco crimes: corrupção ativa, falsidade ideológica, falsifi­cação de documento, tráfico de in­fluência e formação de quadrilha.

Vieira ainda não foi notificado. Quando isso ocorrer, terá 15 dias para entregar sua manifestação à 5.a Vara Criminal Federal. Ele es­tá disposto a dedicar um capítu­lo da defesa exclusivamente a Cyonil - em depoimento à PF, o ex-auditor do TCU declarou que Vieira lhe ofereceu R$ 300 mil por um laudo sob encomenda.

O ex-diretor da ANA acusa Cyonil de pedir dinheiro a em­presas que fiscalizou no TCU.

Segundo o ex-diretor da ANA, a partir do começo de abril de 2010, Cyonil passou a lhe pedir para levá-lo ao dono da empresa Tecondi, Carlos César Floriano.

"Ele dizia que havia ajudado a fazer um relatório que atendia aos interesses da Tecondi e que era credor da empresa", afirma. "Não levei os pedidos ao César Floriano, mas não descartei, fui levando com respostas evasivas e tentando não atender muito ele."