Título: A Cesar o que é de Cesar
Autor: Carolina Brígido
Fonte: O Globo, 21/04/2005, Rio, p. 10

STF determina fim de intervenção nos hospitais municipais Souza Aguiar e Miguel Couto

Depois de 41 dias, a intervenção federal em hospitais do Rio sofreu ontem um baque. Em decisão unânime, o Supremo Tribunal Federal (STF) devolveu à prefeitura o direito de gerir os hospitais Miguel Couto e Souza Aguiar, que sempre pertenceram ao município. E impediu que a União continue usando bens, serviços e pessoal contratados pelo município para continuar administrando os hospitais da Lagoa, de Ipanema, do Andaraí e o Cardoso Fontes. Essas instituições, municipalizadas em 1999, poderão continuar sob intervenção federal.

O presidente do STF, Nelson Jobim, informou que a decisão tem efeito imediato: não é necessário esperar publicação de acórdão. O julgamento impôs a primeira grande derrota ao governo federal com uma votação unânime dos ministros presentes no plenário. A decisão foi tomada no julgamento de um mandado de segurança proposto pelo prefeito Cesar Maia em 16 de março, cinco dias após a publicação do decreto presidencial que declarou estado de calamidade na saúde do Rio e autorizou a intervenção nos seis hospitais.

O STF sequer cogitou cancelar a intervenção nos quatro hospitais que já tinham sido federalizados e estavam, antes da ação federal, sob administração municipal.

De manhã, ministro apostava em vitória

Na ação, o procurador-geral do município, Júlio Rebello Horta, argumentou que a intervenção federal só está prevista na Constituição se antes for decretado estado de defesa, o que não ocorreu no caso do Rio. O advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro Costa, disse ontem que o decreto não tratou de intervenção, mas de requisição federal ¿ uma possibilidade incluída na lei que disciplina o Sistema Único de Saúde (SUS).

Os dez ministros presentes ao julgamento concordaram com os argumentos da prefeitura. Eles votaram seguindo o princípio federativo da Constituição segundo o qual a União só pode decretar intervenção em estados e no Distrito Federal, não diretamente em municípios. Muitos ministros disseram que a requisição federal promovida pela União não passava de uma forma velada de intervenção.

¿ Foi uma intervenção disfarçada, enrustida. Só nos casos de estado de defesa a União pode apossar de bens e pessoas ¿ declarou o ministro Carlos Ayres Britto em seu voto.

¿ Não foi feita apenas uma requisição, mas a expropriação temporária de bens ¿ opinou o ministro Cézar Peluso.

¿ Foi um decreto calamitoso, infeliz. Um retrocesso, passados tantos anos do regime de exceção ¿ afirmou Marco Aurélio.

Apenas o ministro Eros Grau não estava presente à sessão, que durou cerca de quatro horas. O relator, Joaquim Barbosa, chegou a optar por uma solução intermediária, em que permitia a continuidade da intervenção desde que o governo federal apresentasse justificativas mais concretas. Em seguida, por influência dos colegas, Barbosa recuou e votou pela ilegalidade do decreto presidencial. O restante dos ministros sacramentou a derrota do governo.

Após a sessão, Álvaro Ribeiro Costa alertou para o problema de que não seria possível contabilizar e separar os recursos contratados pela União e pelo município nos quatro hospitais que continuaram sob administração federal. Para o advogado, isso poderia comprometer a continuidade do trabalho realizado pela União nas instituições.

Por intermédio de sua assessoria, o ministro da Saúde, Humberto Costa, limitou-se a informar que vai cumprir a decisão do STF. De manhã, antes do julgamento, acreditava que sairia vitorioso:

¿ O trabalho do Ministério da Saúde está num bom caminho. Do ponto de vista de gestão municipal da saúde no Rio, é preciso uma reestruturação profunda. Minha expectativa é que a ação seja considerada constitucional. O STF vai julgar com os fatos, com a realidade da saúde no Rio ¿ comentara.

COLABOROU Fábio Vasconcellos