Título: BC puxa o freio
Autor: Enio Vieira, Ricardo Galhardo e Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 21/10/2004, Economia, p. 21
O Banco Central decidiu ontem aumentar o ritmo de alta dos juros e elevou a taxa básica (Selic) de 16,25% para 16,75% ao ano. Em setembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) avisou que começara um ajuste moderado dos juros. Na ocasião, subira 0,25 ponto. Após a indicação do BC, os analistas de mercado avaliaram que o Copom não aumentaria a dose, apesar do recente reajuste nos preços de combustíveis. Como os diretores do BC não indicaram viés (tendência), os juros ficarão estáveis até a próxima reunião, em 16 e 17 de novembro.
Motivos para a subida dos juros não faltariam: o BC está acompanhando com preocupação indicadores que mostram o aquecimento da economia brasileira nos últimos meses. Além disso, subiu a estimativa de inflação para 2005. Há um mês, o BC divulgou que perseguia a meta de 5,1% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no ano que vem. No entanto, a instituição previa em setembro inflação de 5,6% em 2005, o que exigiria aperto nos juros.
No breve comunicado após a reunião, que durou duas horas e meia, os diretores do BC informaram que a decisão apenas dava continuidade ao ajuste iniciado em setembro: ¿Dando prosseguimento ao processo de ajuste moderado da taxa de juros básica iniciado na reunião de setembro, o Copom decidiu elevar, por unanimidade, a taxa Selic para 16,75% ao ano, sem viés¿, diz a nota dos diretores.
Pouco depois do anúncio do Copom, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a dizer que a economia deve ser administrada com responsabilidade e que ele não tem o direito de errar:
¿ Tenho consciência das experiências negativas que esse país já viveu. Tenho consciência dos vôos de galinha que esse país já deu. Quantas noites fomos dormir achando que o país tinha definitivamente recuperado sua economia e, no dia seguinte, acordávamos devendo mais do que a gente devia na noite anterior ¿ afirmou ele, durante a abertura do Salão do Automóvel, em São Paulo. ¿ É melhor você andar a passos mais lentos, mas andar sempre para frente, do que dar um passo muito grande e quebrar o cara no primeiro pulo.
¿ Não tenho o direito de errar. Cada medida tem de ser pensada de forma milimétrica ¿ arrematou Lula.
Para os setores ligados ao varejo e alguns especialistas, a alta deve afetar as vendas de Natal. O presidente da Fecomércio-RJ, Orlando Diniz, considerou a subida dos juros uma ameaça à melhora das vendas de fim de ano esperada por todo o segmento do comércio de bens e serviços.
Varejo já espera vendas mais fracas no Natal
Para a economista da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), Suzanne Bouchardet, o aumento dos juros terá impacto direto no comércio, já que 70% do total de vendas do varejo são a prazo:
¿ A retomada do crescimento do comércio em 2004 se deve ao aumento das vendas a prazo ¿ disse.
Sérgio Werlang, ex-diretor do BC, também espera queda na venda de bens duráveis (como carros e eletrodomésticos), sobretudo no Natal.
A Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) já admite elevar a projeção de inflação para o ano, de 6%, e para outubro, de 0,44%. Isso porque os aumentos na gasolina e no diesel superaram o previsto pela Petrobras.