Título: A OPOSIÇÃO DO PT É O PRÓPRIO PT
Autor: Delcídio Amaral
Fonte: O Globo, 19/06/2005, Opinião, p. 7

É com satisfação, com orgulho e até mesmo uma ponta de vaidade que tenho lido ocasionais referências onde se afirma que a minha vida profissional, o meu passado e o meu comportamento, nestes dois anos e meio em que exerci atividade política, no Senado Federal, seriam uma garantia de condução isenta da CPI dos Correios.

Essas referências têm servido de estímulo adicional à minha determinação de levar a bom termo a missão de conduzir a CPI com equilíbrio, respeitando posições de governistas e oposicionistas, ouvindo atentamente as partes envolvidas, de forma a poder produzir, ao final dos trabalhos, um relatório sustentado em argumentos sólidos e indiscutíveis.

Como representante, em primeiro mandato, do meu estado, Mato Grosso do Sul, sou obrigado a admitir que estou ainda na fase de aprendizado. Ao mesmo tempo, procuro assimilar algumas das lições consagradas, aquelas que viram verdades na voz do povo, que sempre têm um fundo de razão.

Entre elas, por exemplo, a existência, dentro do Partido dos Trabalhadores, da prática que já se convencionou chamar de "fogo amigo". Acabo de ser mais uma vítima, talvez a mais recente, desse fogo que se diz "amigo", mas que tem causado inúmeros problemas ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No momento em que assumo a responsabilidade de conduzir talvez a CPI mais importante do Congresso Nacional, sou apunhalado pelas costas, atingido por uma reportagem de alto de página no jornal "O Estado de S.Paulo", com chamada na primeira página, onde se afirma que "Contratos feitos por Delcídio causaram prejuízos à Petrobras". Sobre esses supostos prejuízos não cabe falar aqui. Já foram esclarecidos à exaustão pela mídia. O que me leva a ocupar este espaço nas páginas de um jornal com a respeitabilidade do GLOBO é um alerta ao governo do presidente Lula e ao nosso partido.

É de toda conveniência acabar, já, imediatamente, com essa história de "fogo amigo". Não existe fogo amigo. É fogo. Punhalada pelas costas é punhalada pelas costas. Ainda mais nesse caso da Petrobras.

Quem tem um mínimo de conhecimento da empresa, sabe que esse "fogo amigo" tem nome e sobrenome. Trata-se do professor Ildo Sauer, atual diretor de Gás e Energia da Petrobras.

Eu afirmei no plenário, num momento de perplexidade e exaltação diante da leitura do jornal, que a presença de Ildo Sauer numa diretoria importante, como a que ele ocupa, é nociva aos interesses da empresa, dos seus acionistas e do próprio país.

Agora, neste artigo, escrito com a cabeça fria e podendo meditar sobre cada palavra, gostaria de sugerir ao presidente da República que aproveite as modificações que pretende fazer no governo e incluísse nelas uma reavaliação nos critérios que determinaram alguns cargos naquela que é a principal empresa do país. A notícia dos supostos prejuízos, como outras, foi "plantada", como se diz no jargão das redações. É assunto velho, já explicado, pisado, repisado, batido e rebatido. No entanto, periodicamente, volta à tona, trazido por companheiros do próprio partido. Infelizmente, parece ser verdade uma das máximas que já caiu na boca do povo, pelo menos daqueles que acompanham a política mais de perto: "O PT não precisa de oposição. A oposição do PT é o próprio PT."

Quando levei ao plenário do Senado os episódios aqui relatados recebi uma torrente de apartes de colegas da oposição e de companheiros, como os senadores Tião Viana e Cristovam Buarque, eles também com a experiência de terem sido vítimas do "fogo amigo".

Seria ocioso e repetitivo voltar ao assunto do "apagão" do governo Fernando Henrique e das providências tomadas na época para tentar minimizar seus efeitos. E quanto ao fato de as usinas termoelétricas, dada a mudança no regime de chuvas, provocarem prejuízos à Petrobras, gostaria de lembrar, pela enésima vez, que os contratos das usinas estabeleciam a sua rediscussão, a qualquer momento, inclusive por arbitragem.

Por que, então, a diretoria responsável não chamou os parceiros para rediscutirem esses contratos em novas bases? Por que esperar que um companheiro seja indicado para a delicada função de presidir a CPI dos Correios, para tentarem descredenciá-lo?

Não conheço time que vença partidas quando o zagueiro chuta para dentro do seu próprio gol. Sou uma pessoa de conciliação, de diálogo. Esse é o meu temperamento e o meu compromisso, agora, é presidir uma CPI eficiente, aberta ao contraditório, onde todos tenham o direito de defesa e sejam castigados aqueles que tiverem culpa comprovada. E que, ao final dos trabalhos, as próprias instituições e procedimentos políticos e administrativos sejam aprimorados e aperfeiçoados. É importante lembrar esse detalhe tantas vezes ignorado. As CPIs não são feitas só para punir. Elas podem ajudar na construção de um Brasil melhor, mais digno, mais cidadão.