Título: GATILHO CONTRA O DRAGÃO CHINÊS
Autor: Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 23/06/2005, Economia, p. 25

Camex aprova uso de salvaguardas caso importações da China cresçam mais que 7,5%

A Câmara de Comércio Exterior (Camex) aprovou ontem dois decretos, que serão publicados mês que vem, permitindo a adoção de salvaguardas para proteger a indústria nacional dos produtos chineses. O governo brasileiro decidiu ser rigoroso na aplicação do acordo feito pela China ao entrar na Organização Mundial do Comércio (OMC): vai estabelecer o limite de 7,5% ao ano para o crescimento das compras de têxteis e confecções da China. Será como um gatilho: se as importações crescerem mais do que isso e uma negociação setorial não encerrar a disputa, a salvaguarda entrará automaticamente em vigor, antes mesmo de o processo de análise de danos ser concluído.

O Brasil poderia ter adotado um percentual maior, impondo uma restrição menor à China, mas decidiu fazer uso pleno de seus direitos como membro da OMC. O anúncio foi feito pelo secretário-executivo da Camex, Mário Mugnaini, e deve motivar recursos dos fabricantes brasileiros de vestuário, tecidos e fios.

Mugnaini explicou que, após as empresas do setor têxtil entrarem com uma petição no Ministério do Desenvolvimento, empresários brasileiros e chineses terão 30 dias para chegarem a um acordo. Na falta de entendimento, abre-se um processo de investigação, e a China será obrigada a restringir suas exportações para o Brasil ao valor registrado nos 12 meses anteriores, com acréscimo de até 7,5% sobre o total.

Proteção para têxteis, se aplicada, será de pelo menos dois anos

O ministério terá até 90 dias para concluir as análises e poderá, então, aplicar uma limitação ainda mais rígida, dependendo do prejuízo sofrido pelo produtor nacional.

- Esse percentual já estava previsto e vamos segui-lo. A limitação será ainda maior para fios de lã, de 6% - disse Mugnaini.

Com a publicação dos dois decretos - um para a área têxtil e outro para os demais produtos - no Diário Oficial, os setores que se sentirem prejudicados poderão entrar com petições. Mas as investigações serão precedidas de uma negociação preliminar. Para os demais produtos, a aplicação de sobretaxas ou de cotas vai depender do dano causado pelo surto de importações.

Os decretos seguirão o modelo adotado pela União Européia (UE), que este mês concluiu um acordo com a China. As salvaguardas para têxteis serão válidas por dois anos, podendo ser prorrogadas por mais um. Para os demais produtos, o prazo é de um ano, prorrogável por mais 12 meses.

- A vantagem da negociação preliminar é a rapidez. Só vamos agir se formos provocados. A idéia é evitarmos uma invasão de produtos chineses - disse Mugnaini.

UE reduz subsídios do açúcar depois de vitória brasileira

Semana passada, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, enviou a seu colega chinês, Bo Xilai, uma carta com as razões para as salvaguardas. Furlan ressaltou que aumentaram muito as compras de produtos de alto valor agregado da China, enquanto as exportações do Brasil se concentraram em produtos básicos, como soja e minério de ferro. Até agora não houve resposta.

Outros setores deverão entrar com recursos, de calçados e armação para óculos até máquinas injetoras para plásticos e tecidos em geral. Os dados assustam. As importações de têxteis cresceram, em média, 60% entre janeiro a abril deste ano; as de calçados, 58%; as de instrumentos de óptica e precisão, 98,2%; e as de componentes e equipamentos eletrônicos, 50%.

A pedido da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, a Camex também aprovou a elaboração de um projeto de lei proibindo definitivamente a importação de pneus usados. Segunda-feira a UE pediu uma consulta formal na OMC, o primeiro passo para a abertura de um painel. Os europeus argumentam que o Brasil abriu uma exceção para o Uruguai, o que, lembrou a ministra, se deve a uma decisão do tribunal arbitral do Mercosul.

Este ano o Brasil ganhou na OMC a batalha do açúcar contra a UE, o que levou o bloco a anunciar ontem uma redução de 40% nos subsídios ao produto nos próximos dois anos.

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"Só vamos agir se formos provocados. A idéia é evitarmos uma invasão de produtos chineses"

MÁRIO MUGNAINI

Secretário-executivo da Camex,