Título: PF investiga esquema de caixa dois no PT-CE
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 13/07/2005, O País, p. 8

Um dos últimos telefonemas dados por ex-dirigente petista foi para também petista que trabalhava no Banco do Nordeste

BRASÍLIA. Integrantes do PT do Ceará receberam informação da Polícia Federal de que um dos últimos telefonemas dados pelo petista José Adalberto Vieira antes de ser preso com quase meio milhão de reais sexta-feira, num aeroporto de São Paulo, foi para o também petista Kennedy Moura, assessor especial em Brasília da presidência do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), que tem sede em Fortaleza. A informação precipitou a exoneração de Kennedy do BNB, formalizada anteontem. A PF já concluiu que o dinheiro iria para Kennedy: Adalberto teria confessado em seu depoimento.

Quanto à origem do dinheiro, uma das linhas da investigação da PF aponta para empresários paulistas que teriam recebido empréstimos do BNB. No ano passado, o banco lançou o programa Cresce Nordeste, que contou com a disponibilidade de linhas de crédito de R$3 bilhões para empresários que quisessem investir na região. Os recursos são do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), gerido pelo BNB.

Cúpula do PT no Ceará quer explicações de Guimarães

A suspeita, tando da PF quanto de integrantes do PT do Ceará, é que o dinheiro encontrado com Adalberto Vieira no Aeroporto de Congonhas teria sido recolhido junto a esses empresários e formaria um caixa dois para campanhas estaduais de alguns candidatos petistas e até mesmo no processo de eleição direta, no estado, para a a escolha do novo presidente do PT, em setembro. Antes da crise política, José Genoino era o candidato favorito à reeleição.

Diante das informações e suspeitas da PF, a cúpula do PT no Ceará vai cobrar explicações do deputado estadual José Nobre Guimarães (PT), irmão de Genoino, sobre eventual ligação do seu ex-assessor Adalberto Vieira com o ex-assessor do Banco do Nordeste Kennedy Moura. A PF deve pedir a quebra dos sigilos telefônicos de Adalberto, Kennedy e Guimarães. Outros dirigentes do BNB também podem ter os sigilos quebrados.

- Eu acho esse o caso mais chocante envolvendo o PT do Ceará. É surpreendente. Guimarães deve explicações a todos nós - disse o deputado João Alfredo (PT-CE).

A exoneração de Kennedy foi uma estratégia para preservar o presidente do BNB, Roberto Smith. Tanto Smith como Kennedy foram indicações do deputado Guimarães. A proximidade de Kennedy com o irmão de Genoino é antiga. Na legislatura anterior, Kennedy foi assessor jurídico de Guimarães na Assembléia Legislativa. Os dois são amigos. Segundo um petista do Ceará, a exoneração de Kennedy do BNB foi como a assinatura de uma confissão de culpa.

Petistas do Ceará, principalmente os ligados à prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins, desconfiam que Guimarães sabia da viagem de Adalberto a São Paulo. A prisão dele foi a gota d'água para a saída de Genoino da presidência nacional do PT.

BNB: Keneddy Moura pediu desligamento do banco

Em nota, a assessoria de imprensa do Banco do Nordeste informa que Kennedy Moura solicitou segunda-feira seu desligamento, afirmando "não ser mais do meu interesse continuar a prestar serviços à instituição".

A permanência de Kennedy Moura no banco foi posta em xeque quando surgiram rumores de que ele seria o possível destinatário do dinheiro que José Adalberto transportava.

Segundo Guimarães, Kennedy Moura recebeu uma ligação de José Adalberto quando este foi preso. Ainda segundo Guimarães, foi Kennedy também quem lhe comunicou da prisão do seu assessor ainda na manhã de sexta-feira. A pedido do deputado, que participava da reunião do diretório nacional do partido, Kennedy viajou no domingo para São Paulo para conversarem pessoalmente.

- Queria conversar com ele para saber o que levou José Adalberto a estar preso - explicou Guimarães.

Para o deputado, José Adalberto teria ligado para Kennedy ao ser preso porque são amigos e o ex-assessor do BNB também é advogado.

Kennedy Moura ocupava cargo de confiança no Banco do Nordeste desde 2003, quando o petista e economista Roberto Smith foi indicado para a presidência. No fim do ano passado, ele foi afastado do cargo de chefe de gabinete do presidente e transferido para assessoria especial em Brasília. A mudança de cargo ocorreu depois que estourou o escândalo envolvendo o BNB e a empresa Cobra Tecnologia. Na ocasião, a diretoria do banco estatal autorizou a dispensa da licitação para contratar os serviços da empresa.

A Cobra deveria receber pelo serviço R$130 milhões para "fornecimento de solução global visando a modernização tecnológica da plataforma computacional". Kennedy foi apontado como o negociador entre a instituição e a Cobra.

O celular de Kennedy Moura não está recebendo chamadas e em casa uma funcionária diz que ele não se encontra.