Título: Dirceu mantém caixa-preta fechada
Autor: Soraya Aggege
Fonte: O Globo, 07/08/2005, O País, p. 3

Nova direção do PT não tem acesso à contabilidade de transações feitas por grupo do ex-ministro

Anova direção do PT não conseguiu ainda abrir a caixa-preta das finanças do ex-tesoureiro Delúbio Soares. Um mês depois de assumir o comando, os dirigentes indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tiveram acesso às informações sobre as transações ilegais de mais de R$50 milhões repassadas a parlamentares e diretórios regionais. Responsável pela indicação de Delúbio e padrinho de parlamentares e diretórios envolvidos no esquema, o deputado José Dirceu (SP) ainda reina absoluto no partido.

O secretário-geral do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), nega a existência de um acordo, mas admite que o papel dos novos dirigentes é atuar apenas dentro da contabilidade oficial, ignorando o caixa dois:

¿ Só trabalhamos com a contabilidade oficial. Nada temos a ver com outras contabilidades. Nosso papel é fazer o PT trabalhar regularmente. Não é nossa função investigar. Quem cuida disso é a Polícia Federal, as CPIs e o Ministério Público Federal.

Mesmo na contabilidade oficial, os novos dirigentes têm evitado escancarar os absurdos que encontraram. Fazem segredo de detalhes sórdidos. Por exemplo: Delúbio gastou R$21 milhões em shows populares, como Wanessa Camargo e Zezé de Camargo & Luciano. Pagou R$14 milhões e ficou devendo R$7 milhões, que a nova direção ainda não sabe como pagar. E mais: R$1,5 milhão foi gasto com aluguel de jatinhos e viagens para a campanha de Luís Eduardo Greenhalgh à presidência da Câmara.

¿Não somos polícia¿, diz Tarso

Dirceu mantém o controle de todas as informações internas, da máquina burocrática do PT e dos cargos indicados para o governo federal.

¿ Eles (os novos dirigentes) não têm e nem querem as chaves das gavetas escuras. A caixa-preta está fechada e vai continuar assim. Foi feito um acordo com Dirceu. Os novos dirigentes só mudaram a simbologia política. Se abrirem a caixa-preta, vai sobrar para todo o partido ¿ diz um alto dirigente petista.

Segundo o dirigente, muitos petistas se sentem nas mãos do antigo comandante, seja por causa de cargos ou de informações, de modo que a nova cúpula não teria respaldo para recusar o acordo de fazer a intervenção de forma branda e gradual.

Para grande parte dos dirigentes do PT, Dirceu já deu um recado claro: não assumiu irregularidade alguma e acredita no esvaziamento das denúncias.

¿ Não será o PT que buscará a sujeira sob o tapete. Ninguém é louco de peitar Dirceu ¿ diz outro dirigente.

Além de Berzoini, foram nomeados bombeiros da crise petista o ex-ministro da Educação Tarso Genro e o deputado José Pimentel (PT-CE). Nenhum deles vasculhou as irregularidades e até agora ninguém foi punido:

¿ Não somos polícia ¿ repete Tarso, quando cobrado sobre o fato de nenhum dos envolvidos ter sido punido ou investigado em profundidade.

Nem mesmo a funcionária da sede nacional do PT Solange Oliveira, que aparece como sacadora de R$100 mil do empresário Marcos Valério de Souza, foi investigada pelos dirigentes do partido. Ela disse anteontem à PF que apenas cumpriu ordens de Delúbio.

O reinado de Delúbio e Dirceu continua intocado, tanto no diretório nacional quanto nos regionais. E as duas secretárias de Delúbio se afastaram após sua saída, deixando o novo tesoureiro sem as informações.

Além da estrutura, Dirceu ainda tem no comando fiéis escudeiros, como a mulher de Delúbio, Mônica Valente; o secretário de Organização, Gleber Naime; e o secretário de Relações Internacionais, Paulo Ferreira. Quando Genoino renunciou, Tarso foi a terceira opção para a vaga. Mônica Valente foi a primeira a reclamar:

¿ Não podemos aceitar o Tarso. O melhor é Berzoini ¿ disse em uma reunião, no auge do escândalo do qual seu marido foi o maior pivô.