Título: Bisonhices
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 11/08/2005, O Globo, p. 2

Muito se disse, ao longo dos últimos dois anos e meio, que o PT ainda iria acabar com o governo Lula. No início, foram os conflitos internos e os ataques à politica econômica, a sede aparelhista do partido e os erros na ação parlamentar. Revelado o tentacular esquema financeiro, as bisonhices continuam sendo cometidas mesmo no calor da crise.

Foi bisonha a atitude do deputado petista Paulo Pimenta, de acompanhar Marcos Valério à garagem do Senado, depois de seu depoimento à CPI do Mensalão na madrugada de ontem. Se as fitas do circuito interno provarem que partiram juntos, ao contrário do que disse, ele terá entrado no corredor da morte que leva à cassação. Se o encontro reservado já foi altamente inadequado a um vice-presidente da CPI que representa justamente o PT, foi altamente irresponsável o que ele fez ontem de manhã, ao apresentar uma lista de origem suspeita com nomes de beneficiados pelo esquema que Valério montou para o PSDB mineiro em 1998. A manobra incendiou a CPI, deixou os tucanos em pé de guerra e em nada melhorou a situação do PT. A lista que disse inicialmente ter recebido de Valério, e depois que foi apenas conferi-la, circula pelas redações de Brasília há alguns dias. Ninguém se animou a publicá-la porque, embora tendo um timbre do STF, nem Valério assumiu sua paternidade. Fonte de confiança folheou ontem à noite o processo no STF e não a encontrou por lá.

Já as explicações desencontradas sobre o empréstimo que a prestação de contas do PT ao TSE em 2003 atribui ao presidente Lula fortaleceram a decisão da oposição de investigar o presidente a partir deste episódio. Será pedido um esclarecimento por escrito. Mas é bisonha a explicação que se ouve no Planalto sobre a origem do suposto empréstimo. No fim de 2002, já eleito presidente, Lula pede a Paulo Okamoto, como seu procurador - estava montando o Ministério e corria a transição - que tratasse de seu desligamento funcional do PT. Sempre fora quadro remunerado. No encontro de contas, o partido concluiu que nada tinha a pagar mas a receber. Um adiantamento (do qual não havia recibo), uma passagem para dona Marisa e outros gastos de viagem totalizariam R$29 mil. Okamoto não quis pagar e o partido que passara a vida lutando para eleger Lula presidente não abre mão da dívida, lançando-a como empréstimo na prestação de contas oficial. Foi no TSE que a oposição achou a informação. E aí estão agora as investigações voltadas para Lula e para Okamoto, que assumiu ter feito os pagamentos que a CPI quer ver melhor esclarecidos. O Planalto desde o início recusou-se a comentar o assunto: Lula nunca fizera tal empréstimo, o PT que se explicasse. Se a história do litígio trabalhista levianamente transformado em empréstimo procede, a direção petista mostra mais uma vez seu descuido com as questões financeiras e com os simbolismos sagrados da Presidência.