Título: TENSÃO MARCA RETIRADA DE COLONOS DE GAZA
Autor: Renata Malkes
Fonte: O Globo, 15/08/2005, O Mundo, p. 16

Moradores de três primeiros assentamentos a serem removidos dizem que impedirão a entrada do Exército

ESHKOL, Israel. Sob tensão, o governo israelense deu início na madrugada de hoje (tarde de ontem no Brasil) à operação de retirada de colonos de 21 assentamentos judaicos na Faixa de Gaza. Os acessos à região foram bloqueados por forças militares, mas moradores das três primeiras colônias a serem desmanteladas ¿ Kfar Darom, Morag e Nissanit ¿ anunciaram que não permitirão a entrada do Exército.

Horas antes, dois morteiros atingiram Kfar Darom, à noite, momentos depois de o Exército de Israel fechar todos os acessos a Gaza. Ninguém foi ferido nas explosões, mas o incidente preocupou as forças de segurança estacionadas em Kissufim, uma das principais passagens para a região.

A operação teve início com um acordo inesperado entre Israel e a Autoridade Nacional Palestina, visando a uma retirada tranqüila de mais de oito mil colonos da região. De madrugada, 7.500 policiais e militares palestinos foram deslocados para os arredores das colônias com o objetivo de evitar tentativas de invasão das casas recém-abandonadas, ou mesmo ataques a colonos que se mudam.

Barricadas israelenses foram montadas para evitar que manifestantes atrapalhassem a remoção dos moradores de Kfar Darom, Morag e Nissanit. Na colônia de Neve Dekalim, a maior da Faixa de Gaza ¿ onde é esperada a maior resistência à retirada ¿ tanques assumiram posições. De acordo com fontes militares baseadas na passagem de Kissufim, no entanto, o deslocamento dos blindados é uma medida para evitar ataques de facções palestinas.

Alerta total nos arredores da Faixa de Gaza

O comandante-geral da polícia de Israel, Moshe Karadi, declarou estado de alerta total nos arredores da Faixa de Gaza. De acordo com a versão online do jornal israelense ¿Yediot Aharonot¿, o primeiro foco de resistência é representado pelos moradores de Kfar Darom, que teriam decidido bloquear hoje o acesso do Exército ao assentamento. Eles estariam dispostos a impedir que soldados entrem para entregar cartas com o pedido para que saiam pacificamente de suas casas.

O chefe do Estado-Maior do Exército de Israel, Dan Halutz, admitiu que mesmo após a proibição de entrada na Faixa de Gaza imposta a civis nos últimos dias, pelo menos cinco mil ativistas da extrema-direita conseguiram furar o cerco e infiltrar-se clandestinamente para resistir à desocupação. Os intrusos seriam jovens de assentamentos da Cisjordânia, entre eles pelo menos 300 ativistas da região de Hebron ¿ conhecida como um dos mais radicais enclaves judeus na Cisjordânia ¿ que estariam aproveitando as férias de verão para agir.

Esquema especial para três mil jornalistas

Halutz acredita que até quarta-feira metade dos colonos de Gaza tenha abandonado suas casas sem resistência. Quem resistir será retirado à força. Segundo ele, as forças de segurança evitarão entrar nas casas dos colonos ao distribuir as cartas a serem entregues hoje e amanhã.

¿ O Exército vai se comportar com generosidade e respeitar a dor das famílias a serem retiradas. Os soldados podem partilhar do sofrimento e até chorar com os colonos, mas sem deixar de lado sua missão. Viemos prontos para agüentar as pressões, mas isso não é uma luta e não queremos declarar vitoria sobre ninguém ¿ afirmou Halutz.

Enquanto na passagem de Kissufim as forças de Israel fechavam o acesso à Faixa de Gaza, a cerca de 20 quilômetros dali, na cidade de Eshkol, dezenas de jornalistas estrangeiros aguardavam sua vez de seguir para os assentamentos. Um megacentro de imprensa foi montado para atender aos mais de três mil jornalistas cadastrados para a cobertura da operação de retirada.

Segundo instruções do Exército israelense, a cada manhã dois ônibus sairão de Eshkol com 50 jornalistas cada um ¿ 35 da imprensa local e 15 estrangeiros ¿ com destino às colonias a serem evacuadas no mesmo dia.

¿ Pode ser que não consigamos entrar todos os dias, pois haverá um sorteio ¿ conformou-se o apresentador da BBC Roger Hearing, enquanto aguardava o ônibus que o levaria a Kissufim. ¿ Mas não me preocupo, pois a equipe é grande e não creio que isso afete a cobertura dos acontecimentos. Apesar de incômoda, a medida é compreensível. É impossível deixar três mil repórteres circulando num lugar de onde serão retiradas oito mil pessoas ¿ afirmou.