Título: ATIRAR PRIMEIRO...
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 12/09/2005, O GLOBO, p. 2

O mandato do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), virou um cabo de guerra entre governo e oposição. A entrevista concedida por Severino não mudou em nada a postura da oposição, que quer a sua cabeça. Também não alterou a conduta dos petistas, que não têm coragem de defender publicamente os seus, quanto mais assumir uma posição favorável a um de seus aliados.

Severino disse claramente que espera o apoio do governo para concluir seu mandato. Foi por isso que fez questão de se reunir com o ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner, para apresentar previamente sua defesa. E não foi por acaso que o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), saiu em defesa de Severino dizendo que sua versão precisava ser considerada e que é preciso se ater aos fatos.

A oposição nem se deu ao trabalho de examinar os argumentos apresentados por Severino. Seus líderes mantinham ontem a decisão de entrar amanhã no Conselho de Ética com representação por quebra do decoro parlamentar contra Severino. Para a oposição, que elegeu Severino para o cargo, é imperioso afastá-lo para tentar retomar o controle da Câmara. Foi assim, após a CPI do Orçamento, em 1993, que o PFL tirou a presidência do PMDB. É por isso que os líderes da oposição afirmam que não vão respeitar a regra da proporcionalidade, pela qual o partido de maior bancada indica o presidente.

O caso de Severino é didático sobre os processos de natureza política. Antes mesmo que ele tivesse se defendido e que seu acusador apresentasse provas cabais, ele já está condenado na opinião pública. Ao seu caso se aplica um dos principais axiomas dos julgamentos políticos: o acusado é culpado mesmo que prove sua inocência. A cautela deveria recomendar prudência diante da falta de uma prova material contra o presidente da Câmara. Sobretudo depois que passou a existir a hipótese de montagem do documento apresentado pelo comerciante Sebastião Buani. E também porque o cheque da propina ainda não apareceu.

Mas a maioria dos parlamentares, da oposição e do governo, está agindo lastreada na denúncia e no conceito público de Severino, que não é dos melhores. Isso ocorre porque os fatos concretos não importam numa inquisição política. O relevante para os participantes do processo político é estar a favor das ondas que se formam. O clamor público os faz atirar primeiro para investigar depois.