Título: SEVERINO É RECEBIDO E AVISA A LULA QUE RENUNCIA
Autor: Maria Lima e Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 20/09/2005, O País, p. 3

Reunião durou cerca de uma hora. Presidente da Câmara estava transtornado e confuso

BRASÍLIA. Num encontro no Palácio do Planalto, que durou cerca de uma hora, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), foi recebido ontem à noite pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para anunciar que abandona o cargo e o mandato e volta para Pernambuco. Severino apresentou a Lula as opções que lhe restam: afastamento, renúncia ao cargo ou renúncia ao mandato. Mas Lula repetiu o que já havia dito a interlocutores de Severino: ¿Essa é uma decisão muito pessoal¿.

Embora a assessoria do presidente da Câmara tenha dito que ele não comunicou a Lula que iria renunciar ao mandato, ao longo do dia Severino deixou isso claro a seus interlocutores e aos emissários do presidente. Completamente transtornado e confuso ¿ ora achava que poderia ser absolvido no plenário, ora que poderia perder os direitos políticos por oito anos ¿ Severino se rendeu à pressão da mulher, dona Amélia, e dos filhos.

¿ Estão cometendo uma crueldade com a família. Nunca imaginei que uma situação dessas acontecesse. Vamos embora para casa ¿ disse a mulher de Severino, que o teria convencido a renunciar com a alegação de que Severino não teria condições emocionais para enfrentar um processo político por quatro meses.

Lula preferiu falar de futebol ao ser perguntado sobre encontro

O tom do encontro foi negociado pelo ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, e pelo presidente da Infraero, Carlos Wilson, que desde sexta-feira foi escolhido por Lula para ser interlocutor no caso. Severino entrou em contato com Wilson ontem de manhã para acertar o encontro. Também foram acionados Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência), o chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, e o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

Com eles, Lula comentou que não poderia deixar de receber Severino e que sempre teve uma boa relação com ele. Mas ao ser perguntado pelos jornalistas sobre um encontro com Severino, Lula preferiu falar de futebol.

¿ Hoje (ontem), só perguntas sobre o Corinthians ¿ brincou Lula.

Aos interlocutores do presidente, Severino disse que iria lhe comunicar a decisão de renunciar ao mandato. O anúncio será feito amanhã à tarde, em discurso na Câmara.

¿- Quero comunicar ao presidente o que devo fazer ¿ disse Severino aos emissários de Lula.

Nas conversas com auxiliares de Severino, membros da Mesa e parlamentares aliados, o advogado José Eduardo Alckmin foi taxativo:

¿ Juridicamente seria possível sustentar a defesa, mas politicamente o senhor está condenado ¿ disse Alckmin, que desaconselhou o afastamento por licença médica, o que geraria desgaste infrutífero.

A pressão sobre Severino nos últimos dias foi intensa. Enquanto parlamentares como o líder José Janene (PP-PR) negavam a renúncia, ministros ¿ entre eles Márcio Fortes (Cidades), Luiz Fernando Furlan (Indústria e Comércio) e Jaques Wagner ¿ e o presidente da Infraero conversaram longamente com Severino para argumentar que o melhor seria a renúncia ao mandato. Segundo um interlocutor do presidente, Severino teria comentado que qualquer um de seus aliados tinha condições de presidir a Câmara, citando Ciro Nogueira, Nilton Capixaba e João Caldas. Lula apenas ouviu as ponderações de Severino.

Severino não terá direito à aposentadoria de ex-parlamentar

Severino disse a Lula ¿ e vai repetir em seu discurso de despedida ¿ que está sendo vítima de armação política, mas que não teria condições de continuar, pois desgastaria mais a instituição. Lula não opinou sobre o que Severino deveria fazer, mas deixou claro que manterá seus apadrinhados no governo, que ocupam apenas dois cargos: um na Petroquisa, Djalma Rodrigues, e o filho na delegacia da Agricultura em Pernambuco.

Parentes e assessores de Severino estão preocupados com o futuro dele. Dizem que, ao contrário de José Genoino, Valdemar Costa Neto e Roberto Jefferson, ele não terá aposentadoria de ex-parlamentar, porque, na transição do antigo Instituto de Previdência dos Congressistas para o novo sistema previdenciário, Severino resgatou suas contribuições para pagar dívidas pendentes, em vez de continuar pagando e passar para o novo plano.

Ele também não tem imóvel próprio em Pernambuco. Como parlamentar, ocupou apartamento funcional e agora a residência oficial da Câmara. Terá de se manter com a ajuda dos filhos e com uma pequena aposentadoria de ex-deputado estadual e prefeito de João Alfredo.

COLABORARAM Cristiane Jungblut e Luiza Damé