Título: CARNE BARRADA
Autor: Geralda Doca, Mirelle de França e paulo Yafusso
Fonte: O Globo, 12/10/2005, Economia, p. 23

Foco de aftosa leva 29 países a embargarem produtos brasileiros, afetando 46% das vendas

Vinte e oito países ¿ os 25 membros da União Européia mais Rússia, Israel e África do Sul ¿ declararam ontem embargo total ou parcial à carne brasileira, devido à descoberta de um foco de febre aftosa em Mato Grosso do Sul. As notificações foram confirmadas pelo Ministério da Agricultura. Segundo informações extra-oficiais, o Chile também aderiu ao embargo. Entre estes 29 países estão sete dos dez maiores clientes do Brasil, cujas compras representaram 46,5% de toda a carne exportada em 2005.

Além disso, oito estados brasileiros proibiram a entrada da carne de Mato Grosso do Sul: São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso e Rio. Eles temem que seu gado seja contaminado e sua produção, vetada à exportação. Juntos, os sete primeiros mais Mato Grosso do Sul responderam por 90% das vendas externas de bovinos este ano. O país tem 195 milhões de cabeças de gado, sendo 25 milhões (12,8%) em Mato Grosso do Sul.

Segundo as notificações enviadas ao governo brasileiro, Israel e África do Sul suspenderam as compras de todo o país; a UE, de Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo; e a Rússia, só do Mato Grosso do Sul. O embargo do Chile valeria para todo o país.

Segundo o secretário estadual de Agricultura do Rio, Christino Áureo, há duas barreiras na fronteira com São Paulo e uma na divisa com Minas Gerais.

Rio tem 3 barreiras contra a doença

O setor privado teme que outros grandes mercados e pequenos clientes sigam o mesmo caminho. O Brasil é líder mundial em venda de carnes, e as exportações já somam R$2,086 bilhões este ano. Segundo o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Pratini de Morais, não é possível estimar o impacto do embargo porque não se sabe quanto tempo ele via durar. Ele disse que o pior dano é para a imagem do país.

Técnicos do Ministério da Agricultura e da Agência de Vigilância Sanitária de Mato Grosso do Sul investigam um segundo foco no estado. Foram verificados sintomas da doença em uma fazenda no município de Japorã, num raio de 25 quilômetros do primeiro foco, na fazenda Vezozzo. Esta havia cumprido o calendário de vacinação. Não está descartada a infecção por uma variante de um vírus existente no país ou que a vacina não tenha surtido efeito.

Ontem, os técnicos iniciaram o sacrifício de 582 animais da fazenda Vezozzo, que deve terminar amanhã.

Representantes dos estados que ficam na divisa com Mato Grosso do Sul estiveram ontem no ministério para discutir medidas para evitar que a doença se espalhe. Também foi decidido que o governo brasileiro enviará uma missão técnica a Bruxelas e Rússia para prestar esclarecimentos sobre o caso.

Os europeus teriam se mostrado dispostos a suspender o embargo tão logo o governo brasileiro comprove a eficácia das medidas adotadas contra o problema e a confiabilidade do controle sanitário.

O governo da Argentina suspendeu ontem por precaução as importações de carne bovina de Mato Grosso do Sul. A medida proíbe a entrada de animais, produtos derivados e outras espécies que possam ser contaminadas pela febre aftosa. Outros estados não foram afetados.

O preço da carne pode cair no mercado interno, caso se ampliem as restrições de outros países.

¿ A primeira medida dos importadores é suspender as compras do país afetado. Com isso, a produção que seria exportada fica no mercado interno, derrubando os preços ¿ disse Aylton Fornari, presidente da Associação dos Supermercados do Estado do Rio.

Segundo o presidente da Bolsa de Gêneros Alimentícios, José de Souza, o preço da arroba do boi já caiu de R$52 para R$48.

Na BM&F, os contratos de boi gordo atingiram ontem, pelo segundo dia consecutivo, a queda máxima permitida, de 3,5%. Os contratos para entrega este mês foram suspensos após atingirem a mínima de R$57,57, contra R$62,47 na sexta-feira.

COLABORARAM Janaína Figueiredo (Buenos Aires), Vivian Oswald (Bruxelas) e Patricia Eloy (*) Especial para o GLOBO