Título: Sacramentado
Autor: Ilimar Frnaco
Fonte: O Globo, 19/10/2005, O GLOBO, p. 2

O destino do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu (PT-SP) foi decidido ontem pelo relator de seu processo no Conselho de Ética, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). E, a menos que o Supremo Tribunal Federal o socorra, na próxima semana o plenário da Câmara votará o pedido de cassação de seu mandato por quebra do decoro parlamentar. Será uma decisão simbólica.

Os líderes da oposição avaliam que essa votação demonstrará a existência, ou não, e a consistência de um eventual acordo entre o PT e o PP para salvarem os seus da degola. Para a oposição, a condenação de Dirceu será a prova de que a CPI dos Correios chegou a resultados concretos na investigação de desvio de recursos públicos no governo Lula. Por fim, o placar dilatado ou apertado na votação para cassar o mandato de Dirceu sinalizará o ânimo da Casa em relação aos demais, que serão julgados nos próximos meses. Mas aliados do governo acreditam que, cassado o mandato de Dirceu, não haverá ânimo para salvar da punição outros petistas.

Os petistas estão divididos sobre a cassação do mandato de Dirceu. Alguns avaliam que ela aplacará a sede de sangue da oposição e que, dessa forma, seu sacrifício será o preço a pagar para esvaziar a crise. Mas para muitos petistas a cassação representará a perda do líder que construiu um PT pragmático, capaz de vencer os medos do mercado, pavimentando a vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002.

O deputado José Dirceu não tem ilusões quanto ao que lhe aguarda. Sabe que perderá seu mandato. Sua única preocupação é caracterizar que está sendo vítima de um julgamento político e negar seu envolvimento com atos de corrupção. Ontem, após receber a sentença, lamentou que o PT só esteja acordando agora para o fato de que o que está em jogo é o poder. E comentou que é vítima de sua obra e do mito que permitiu que se criasse em torno de sua figura pública. Mitos que foram explorados com maestria pelo relator, quando colocou em dúvida a versão de Dirceu que, a despeito de seu poder e influência, alega em sua defesa que desconhecia as atividades da direção petista.