Título: SIM AO ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL
Autor: PAULO PAIM
Fonte: O Globo, 06/12/2005, Opiniao, p. 7

¿Artigo 1º ¿ É declarada extinta desde a data desta Lei a escravidão no Brasil. Artigo 2º ¿ Revogam-se as disposições em contrário.¿

Foi assim que, em 13/5/1888, a Princesa Isabel libertou os escravos. Negros e brancos abolicionistas comemoraram a vitória cantando e dançando. Com o passar dos tempos viram que a Lei Áurea falava em liberdade, mas não garantia a cidadania.

De lá para cá surgiram outras leis: Afonso Arinos, Caó e a 9.459/97. Todas cumpriram seus papéis em suas épocas, mas foram superadas. Por isso, o Movimento Negro, juntamente com outros setores da sociedade, construiu as propostas que estão consagradas no Estatuto da Igualdade Racial. Peça que não segrega nossa sociedade. Ao contrário: visa dar aos 48% de negros brasileiros a verdadeira cidadania.

Dados divulgados por diversas instituições comprovam que no Brasil os negros são os mais excluídos. O PNUD mostrou, por meio do ¿Relatório de Desenvolvimento Humano Brasil 2005 ¿ Racismo, Pobreza e Violência¿, que 64,1% dos pobres brasileiros são negros. Em 2003, 67,9% das crianças brancas freqüentavam a escola. Entre as negras, eram 32,1%.

O IPEA nos diz que a situação das mulheres negras no mercado de trabalho é ainda pior. Em 2003, 22,4% eram empregadas domésticas. Entre mulheres brancas o percentual foi de 13,3%. O desemprego entre as negras correspondia a 16,6%, duas vezes mais que entre os homens brancos. O número de negros no Executivo, no Legislativo, no Judiciário, nas Forças Armadas, nas universidades e em postos de destaque de empresas e bancos não chega a 5%.

Diante disso, devemos nos perguntar: é esse o Brasil que queremos? Um país em que as desigualdades imperam? Ou buscamos construir uma sociedade, miscigenada sim, mas que respeita as diversidades? Nosso projeto responde por políticas públicas de combate às desigualdades em diversas áreas. Garante a moradia e a terra aos remanescentes de quilombos. Oferece mais oportunidades a mulheres e jovens afro-brasileiros ¿ maiores vítimas de assassinatos.

Garante às vítimas de discriminação racial o acesso gratuito às Ouvidorias nas três esferas de governo, à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário. O sistema de cotas cria oportunidades para os discriminados por raça e/ou cor em diversos setores, tais como universidades, trabalho, mídia e partidos políticos.

Está disposto em seus artigos que a disciplina ¿História Geral da África e do Negro no Brasil¿ será obrigatória ao currículo dos ensinos fundamental e médio, fortalecendo a Lei 10.639/03. Caberá aos estados, municípios e instituições privadas de ensino a responsabilidade de qualificar os professores.

Sabemos que a matéria precisa e precisará de alterações. Um exemplo é o Fundo Nacional da Promoção da Igualdade Racial. Considerado inconstitucional, seu debate foi encaminhado para a peça Orçamentária e trabalhamos com Emenda Constitucional a fim de sanar o problema.

É comum ouvirmos falar que no Brasil não existe mais discriminação e preconceito racial. Não ser racista é mais que ter amigos negros e aceitar sua cultura. Ser livre de preconceitos é acreditar que todos devem ter oportunidades iguais, independente de cor, raça, sexo ou etnia.

A mudança que desejamos pode ser comparada a uma colheita. Cada um de nós deve ser um semeador. Sabemos que estamos sujeitos às intempéries do clima, mas, temos certeza de que colheremos resultados: uma plantação em que a praga do racismo não existirá.

PAULO PAIM é senador (PT-RS) e autor do projeto do Estatuto da Igualdade Racial.