Título: PONTE PARA REATAR COM AS BASES
Autor: Gerson Camarotti, Lydia Medeiros e Isabel Braga
Fonte: O Globo, 13/12/2005, O País, p. 3

Para líderes petistas, crítica reaproxima partido de movimentos sociais

SÃO PAULO. A resolução política aprovada pelo PT no último fim de semana, na qual o partido pede mudanças na política econômica e a redução do superávit primário, desagradou a parte do governo, mas, para líderes petistas, pode servir para que o partido reconstrua as pontes entre o governo e movimentos sociais, que vinham criticando sistematicamente a política econômica.

¿ A resolução abre espaço para reativarmos uma relação na qual tínhamos grande dificuldade por causa do conservadorismo da política econômica ¿ disse o secretário nacional de Movimentos Populares do PT, Bruno Maranhão, que integra a chamada esquerda petista e também é líder do Movimento para Libertação dos Sem Terra (MLST).

O secretário-geral adjunto do partido, Joaquim Soriano, concorda.

¿ Vai ser bom para recuperarmos a relação com essa ala. São coisas que todo mundo estava dizendo. Só faltava o PT ¿ disse ele.

Para o presidente nacional do CUT, João Felício, ao aprovar uma resolução que inclui posições de diversos segmentos, o PT sai ganhando, mas ele lembra que não são apenas os movimentos sociais que têm cobrado mudanças na política econômica.

¿ Se o governo não reduzir os juros agora, isso pode afetar o crescimento em 2006. E seria péssimo eleitoralmente, péssimo para a economia em geral, para a geração de empregos, para os salários. A resolução põe o PT numa posição muito próxima dos movimentos sociais. Mas para o setor produtivo, estas críticas também são muito bem-vindas ¿ disse Felício.

Segundo Bruno Maranhão, além de ajudar na reaproximação com os movimentos sociais, as críticas dão ânimo aos militantes para 2006:

¿ O texto reforça com a militância ligada aos movimentos a imagem de que estamos reconstruindo o partido na linha das suas origens. A disposição para a luta é muito maior.

Soriano: ¿Dissemos dois dedos a menos do que a Dilma¿

Enquanto alguns dirigentes lamentavam a aprovação, pela primeira vez, de uma resolução política crítica ao governo e esperavam uma reação, outros saudavam o surgimento de uma nova relação de forças no partido.

Segundo Soriano, integrante da corrente de esquerda Democracia Socialista, é errado supor que a nota afasta o partido do governo porque não é todo o governo que diverge do teor do texto, apenas a ala ligada ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci:

¿ Dissemos dois dedos a menos do que a Dilma (Rousseff, chefe da Casa Civil) fala. A novidade é que pela primeira vez, de forma incontestável, o partido demonstrou que esta política não é a do PT.

Para alguns líderes do PT, as críticas abertas de Dilma a Palocci e o resultado negativo do PIB no terceiro trimestre foram o combustível que faltava para que o PT cobrasse mudanças na política econômica.

¿ Vozes dissonantes como as de Dilma e (Luiz) Marinho (ministro do Trabalho) agora têm a prova de que houve um erro na condução da economia: o PIB negativo ¿ disse Felício, afirmando que o partido quer apenas ajustes e não mudanças radicais na economia, e que a decisão do PT deve dar força à ala que pede a redução dos juros. ¿ A resolução fortalece essas pessoas dentro do governo.

Muitos dirigentes lembraram que o apoio do presidente do partido, Ricardo Berzoini, à resolução não pode ser visto como uma surpresa. Berzoini cobrou publicamente mudanças na política econômica quando foi ministro da Previdência e do Trabalho.

O ex-ministro da Educação e ex-presidente do PT Tarso Genro publicou um texto ontem no site do partido afirmando que também criticou a economia quando estava no governo.

¿Sustentava uma série de posições ¿ então minoritárias no partido ¿ não somente sobre a necessidade de mudanças na política econômica, mas também posicionava-me contra a `autonomia¿ do Banco Central e, igualmente, contra a `flexibilização¿ dos direitos trabalhistas. Na época eu integrava o primeiro escalão de governo e verbalizava a posição da ampla maioria dos ministros sobre o assunto.¿