Título: LADEIRA ABAIXO
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 15/12/2005, O País, p. 4

A performance do prefeito de São Paulo, José Serra, na pesquisa do Ibope divulgada ontem foi uma ducha de água fria nas pretensões de Geraldo Alckmin, ainda mais porque o governador paulista conseguiu atingir todas as metas a que se propunha nessa altura da disputa eleitoral interna do PSDB: ficou empatado com Garotinho, e perdeu de pouco para Lula na simulação de segundo turno.

Mostrando fôlego para subir nas pesquisas de opinião, apesar de ser menos conhecido, Alckmin começaria a transformar em prática sua teoria de que tem mais espaço para subir na aprovação do eleitorado nacional do que Serra, que estava estacionado na casa dos 30% nas últimas pesquisas.

Afinal, para quem tem apenas 40% de nível de conhecimento nacional, 20% de apoio é mais do que os 30% de um Serra conhecido por praticamente todo o eleitorado brasileiro, por ter disputado a última eleição presidencial contra Lula em dois turnos. Mas eis que Serra aparece superando Lula já no primeiro turno, e com a marca de 37% de preferência, índice que Alckmin só conseguiria num hipotético segundo turno, onde Serra obteria quase metade dos votos (48%), vencendo Lula por 13 pontos percentuais.

Além do mais, o presidente Lula atingiu seu mais baixo índice de intenção de voto nas simulações de primeiro turno desde que assumiu o governo, voltando, ele sim, para a casa dos 30%, seu patamar histórico nas eleições anteriores em que foi derrotado. Na simulação do segundo turno, o candidato tucano Serra recebe perto de um terço dos votos dados a Lula na eleição de 2002, e teria uma sólida maioria entre os que não votaram naquela ocasião.

Esses números confirmariam que as chances de Serra crescer são reais, pois ele teria praticamente garantido os mesmos votos que obteve na eleição de 2002, e atrairia uma legião de eleitores arrependidos que votaram em Lula, especialmente da classe média.

É muito difícil que o governador Geraldo Alckmin consiga superar Lula na última pesquisa do Ibope antes do prazo de desincompatibilização, que é março do próximo ano. Embora seja previsível que Lula continue perdendo prestígio, à medida que a crise não dá mostras de terminar. Por isso, suas chances de sair candidato continuam menores que as de Serra, embora não desprezíveis.

O que é surpreendente na pesquisa do Ibope é que Lula perderia em todos os segmentos de renda, inclusive entre os eleitores que ganham até dois salários-mínimos, a base da pirâmide social onde se concentram os programas assistencialistas do governo, como o Bolsa Família.

Acima de dois salários, e até mais de dez, os resultados são praticamente estáveis: Serra tem cerca de 51% dos votos, contra apenas 34% de Lula. Lula teria resultados adversos também nas capitais, na periferia e no interior do país. Continua vencendo apenas no Nordeste, mas sua margem de liderança já está muito estreita: venceria por uma margem de apenas três pontos.

O governo Lula continua tendo avaliação negativa na maioria dos segmentos sociais, mas mesmo onde apresenta recuperação do prestígio, Lula perde feio para Serra num eventual segundo turno. É o caso, por exemplo, da faixa de renda entre cinco e dez salários-mínimos, onde a avaliação do governo de ¿ótimo e bom¿ subiu de 23% para 27% em dezembro, caindo o ¿ruim e péssimo¿. Mas nessa faixa, Lula perde para Serra de 50% a 32% na simulação do segundo turno.

O que parece mais preocupante para a candidatura de Lula à reeleição é que cresce a cada pesquisa a desconfiança do eleitorado em relação a ele, o que pode ser fatal para um candidato que terá a seu lado apenas a capacidade pessoal de seduzir o eleitorado. Hoje o presidente Lula tem a confiança de apenas 43% dos eleitores, o menor índice de confiança desde que assumiu o governo, com um saldo negativo de dez pontos.

Ainda tem no Nordeste o maior número de eleitores que confiam nele. Essa desconfiança generalizada vem do aumento cada vez maior da frustração dos eleitores diante das expectativas que tinham em relação ao governo Lula, sentimento que vem sendo detectado desde o início do ano.

Apenas 20% afirmam que o governo é melhor do que esperavam, o menor índice já registrado nas pesquisas. A reprovação ao modo de governar de Lula já atingiu 52% do eleitorado, que passou também a ter uma visão mais crítica com relação às políticas setoriais.

Das sete áreas apresentadas na pesquisa do Ibope, (combate à fome e ao desemprego; programas sociais na área de saúde e de educação; segurança pública; combate à inflação; taxa de juros; combate ao desemprego), todas tiveram um índice de desaprovação maior que a aprovação, num claro sinal de que a percepção da ineficiência do governo já está chegando à população.

Apesar das críticas aos juros altos e o temor do desemprego, a área econômica traz boas notícias dos eleitores: o brasileiro está mais otimista em relação à sua renda pessoal, e também à das pessoas em geral. Com o empenho pessoal do presidente Lula em aumentar ¿o mais possível¿ o salário-mínimo, e de dar aumento aos servidores, além de agradar à classe média reajustando a tabela do Imposto de Renda, pode ser que esse clima otimista se reflita nos índices de popularidade do presidente.

Se a verticalização for mantida, é provável que o número de candidatos à Presidência seja menor do que o esperado, com PMDB, PFL e PDT desistindo de candidatos próprios. Nesse caso, é possível que a eleição, polarizada entre PT e PSDB, seja resolvida ainda no primeiro turno.

Paradoxalmente, hoje para Lula o melhor seria, não podendo ter o PMDB em sua chapa, que o partido apoiasse a candidatura de Garotinho. Ela garantiria um segundo turno e, caso ele fosse disputado entre Garotinho e Lula, seria talvez a única chance de Lula vencer a eleição.