Título: Surgem indícios de que empresa não existe
Autor: Rodrigo Rangel
Fonte: O Globo, 10/02/2005, O Mundo, p. 26

Tudo indica que os cerca de 500 militares brasileiros da ativa e da reserva candidatos a trabalhar como agentes de segurança no Iraque estão sendo enganados pelos recrutadores Frank Guenter Salewski e Heiko Helmut Seibold, que dizem trabalhar para a empresa Inveco International, que seria uma divisão do Inveco Global Security Group.

Por um lado, eles alegam que a firma está sediada na Flórida, nos EUA, tendo ainda escritórios em San José, Costa Rica e Genebra, Suíça. Mas se a firma de fato existe em território americano estaria funcionando ilegalmente ¿ já que não está registrada, como deveria, na Divisão de Corporações da Flórida.

¿ Pode ser apenas uma fachada. Quem está por trás disso pode ter um representante aqui na Flórida que, na verdade, trabalha para uma outra companhia, que pode estar sediada em outro país e que não quer dar as caras nesse recrutamento ¿ disse ao GLOBO um porta-voz daquela agência estadual.

Por outro lado, o salário oferecido aos brasileiros ¿ de US$ 6,5 mil a US$ 8 mil mensais ¿ seria uma ilusão, segundo especialistas do ramo. As cifras são demasiado altas. Afinal, essas quantias estão sendo oferecidas a quem se dispuser a trabalhar como segurança de instalações militares no Iraque. E quem hoje faz esse tipo de serviço por lá ganha menos, segundo Gary Jackson, fundador e presidente da empresa Blackwater USA, da Carolina do Norte, que recruta mercenários em todo o mundo.

Os temidos gurkas do Nepal, mercenários com prestígio internacional, recebem US$ 1 mil mensais. Colombianos, nicaragüenses e salvadorenhos vêm sendo recrutados por US$ 1.200 mensais. Sessenta chilenos, contratados pela Blackwater para proteger instalações petrolíferas no Iraque, recebem US$ 4 mil por mês:

¿ Nós passamos um pente fino em todo o planeta em busca de bons profissionais, e os chilenos são ótimos ¿ disse Jackson, insinuando que a qualidade dos mercenários do Chile, que ganham mais, é melhor do que a dos encontrados no Brasil.

A suspeita de que a Inveco International seja apenas uma fachada que protege o verdadeiro contratante tem sido reforçada pelo próprio silêncio de quem é tido como seu diretor e executivo-chefe nos EUA, Pierre P. Orosz, que se apresenta como ex-agente das forças especiais do Exército belga.

Há cinco dias ¿ desde que o recrutamento foi descoberto pelo GLOBO ¿ ele se mantém em silêncio a esse respeito. Mensagens deixadas nos telefones apresentados pelos recrutadores como dele não são respondidas, assim como recados por e-mail. Seibold e Salewski argumentaram, ontem, que Orosz estaria fora dos EUA, a trabalho, com acesso possível apenas através de um telefone via satélite ¿ mas cujo número eles se negaram a informar.

Para Peter Singer, pesquisador da Brookings Institution especializado nesse assunto, o governo brasileiro está com um problema complexo nas mãos. Apenas um número pequeno de países têm regras específicas para a contratação desse tipo de mão-de-obra:

¿ A grande maioria de leis e regulamentações domésticas ignoram o fenômeno de mão-de-obra militar privada, ou é incapaz de definir ou regulamentar a indústria de mercenários ¿ disse ele.