Título: USINEIRO DESCUMPRE ACORDO COM GOVERNO
Autor: Ramona Ordonez e Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 16/02/2006, ECONOMIA, p. 25

Álcool já começa a faltar no atacado e produtores querem renegociar teto de R$ 1,05

RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA. Distribuidoras de combustíveis começam a enfrentar dificuldades para comprar álcool, e usineiros já vendem o produto no mercado livre, fora dos acordos de fornecimento com algumas empresas. No atacado, o produto já é vendido a R$1,07 o litro, acima do teto máximo de R$1,05, acertado com o governo mês passado. Devido à crescente escassez de álcool disponível no mercado, os usineiros vão pedir ao governo federal para aumentar os preços do produto. Circularam rumores ontem no mercado de que os produtores pensam também em pedir ao governo para reduzir o percentual de álcool anidro na gasolina, que hoje é de 25%, para evitar a falta. Mas muitos usineiros não consideram essa uma boa opção, porque acabaria elevando os preços da gasolina e provocaria revolta dos consumidores contra os produtores. Na prática os usineiros já estão descumprindo o acordo acertado com o governo, vendendo álcool acima do teto de R$1,05 o litro (sem PIS/Cofins). Segundo um executivo de uma distribuidora de combustíveis de médio porte, desde a semana passada passou a ser difícil encontrar álcool para compra no mercado. Os produtores, segundo o executivo, alegam que o pouco álcool disponível se destina a atender aos contratos firmados com diversas distribuidoras. Fora os contratos, o álcool pode ser vendido por até R$1,079 o litro, conforme confirmou dirigente de outra distribuidora de porte médio. - Não estamos encontrando álcool no mercado, e quando tem, é com preço acima do teto fixado pelo acordo - reclamou o executivo, que compra por contratos cerca de 50% do que precisa e o restante, no mercado livre. As grandes distribuidoras que dominam o mercado de combustíveis, como Petrobras Distribuidora (BR), Ipiranga, Shell, Esso e Texaco, ainda não enfrentam dificuldades na compra do álcool. Isso porque, segundo um dirigente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), a maior parte das compras é feita com garantias de fornecimento, uma espécie de contrato. Essas distribuidoras ainda estariam pagando o valor fixado pelo acordo, de R$1,05 por litro. Os usineiros enviaram segunda-feira pedido ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para reajustar esse valor. No pedido, feito em caráter de urgência, eles requerem flexibilização dos preços.

Produtores temem revolta de consumidor com reajuste

Se aceita, a medida provocaria novo reajuste para o consumidor, mas os usineiros afirmam que assim seria possível conter a demanda pelo produto - que continua aquecida. Negando que o setor esteja estocando ou escondendo o produto à espera de melhores preços, eles afirmam que haveria risco de desabastecimento. Os produtores reclamam também que estão perdendo dinheiro ao vender o álcool anidro por R$1,05 o litro, quando o mercado externo tem pago preços mais altos. Na média das operações de exportação, o produto tem sido vendido a R$1,15. Sem citar nomes, eles dizem que algumas distribuidoras têm aproveitado essa diferença, comprando aqui e revendendo o produto no exterior. - O mercado pode ser mais forte (do que o teto de preços) - diz um empresário. Até ontem o governo não havia acenado com uma resposta para o setor, que em troca poderia oferecer a produção de 850 milhões de litros de álcool entre março e abril, em plena entressafra. A safra 2006/2007 só começa em maio. O Ministério da Agricultura informou ontem que só conhece extra-oficialmente a proposta dos usineiros. Segundo a assessoria de imprensa do ministério, assim que o pedido for formulado oficialmente, as conversas devem começar, mas lembrou que esse tema envolve também a Fazenda, a Casa Civil e a pasta de Minas e Energia.