Título: SOCIÓLOGO: CÂMARA FAZ `PIADA DE SALÃO¿ DE DELÚBIO
Autor: Isabel Braga e Maria Lima
Fonte: O Globo, 12/03/2006, O País, p. 12

Absolvição de três deputados que receberam dinheiro do valerioduto leva a propostas de julgamento externo e nas urnas

BRASÍLIA. As três últimas absolvições de deputados e a perspectiva de que, dos nove que estão na fila, quatro têm chance de escapar da cassação, acentuaram o clima de descrédito em relação à capacidade da Câmara de punir seus integrantes por irregularidades comprovadas como a prática de caixa dois. A punição ao pior escândalo do Congresso dos últimos tempos poderá se resumir a meia dúzia de parlamentares.

Dos 18 acusados de envolvimento no escândalo do mensalão, quatro já foram absolvidos. Só dois foram cassados ¿ Roberto Jefferson (PTB-RJ) e José Dirceu (PT-SP). Quatro renunciaram para fugir da cassação ¿ Valdemar Costa Neto (PL-SP), Carlos Rodrigues (PL-RJ), Paulo Rocha (PT-PA) e José Borba (PMDB-PR) ¿ e anunciam planos de se candidatar, já que não perderam os direitos políticos.

O senso comum na sociedade é de que o Congresso já encerrou sua fase de punições e a CPI dos Correios fechará as portas antes do fim de março sem mostrar quem alimentou o valerioduto. O que faz surgir propostas como a de que parlamentares acusados sejam punidos pela Justiça ou mesmo pelo povo.

Desalentado, o sociólogo Chico Oliveira, ex-petista, diz que quem está certo é o pivô do escândalo, Delúbio Soares, que previu que o mensalão iria virar piada de salão. E lamenta que tenha virado piada muito antes do que se esperava: Marcos Valério e Delúbio continuam vivendo bem, e o PT acha que já se redimiu e que até as eleições de outubro o escândalo terá pouco impacto na reeleição do presidente Lula.

Oliveira defende um mecanismo de consulta popular para a punição dos envolvidos nesse tipo de corrupção, já que o Congresso mostrou que atingiu sua cota de autopunição:

¿ Essa CPI fez muito barulho por nada. Um esforço extraordinário que não vai terminar em lugar algum. Depois dessas absolvições, o João Paulo já se sente livre. A população não se deu por satisfeita com as cassações do Zé Dirceu e do Roberto Jefferson, mas vai fazer o quê? Nem está acompanhando mais o desfecho das investigações.

O cientista político da PUC de Minas Malco Camargos também defende um julgamento externo:

¿ O problema é que em nome da independência entre os poderes mantém-se o julgamento desta forma, que só pode gerar corporativismo.

A tese encontra adeptos no Congresso. O vice-presidente da Câmara, José Thomaz Nonô (PFL-AL), diz que deputados não são treinados para julgar. Por isso, embora esteja estudando um projeto para fortalecer o Conselho de Ética ¿ do qual foi o primeiro presidente ¿ acredita que o melhor seria transferir a função ao Judiciário, como fazem outros parlamentos.

¿ A Câmara vai sempre viver o clima de suspeição, de não votar com isenção. Este último episódio foi desastroso: durante um ano viramos uma delegacia de polícia, sem fazer nada. Não podemos correr o risco de ver novamente o Congresso paralisado por essas coisas ¿ queixa-se Nonô.

Mas nem as lições morais tiradas da crise adiantam quando se trata de um deputado votar o destino de outro. Esta é a convicção de um dos coordenadores do Movimento Pró-Congresso, Fernando Gabeira (PV-RJ), que prega o voto aberto.

¿ A recuperação de Lula foi um sinal verde para qualquer tipo de acordo. Pensaram assim: a opinião pública não está interessada na questão ética. Mas acho que estão equivocados. Depois da Copa do Mundo, a eleição passará a interessar mais e, assim como no caso do desarmamento, as pesquisas mostrarão a realidade.

O professor Malco aposta numa resposta das urnas:

¿ O eleitor acompanha e pune com a sua arma, o voto.

Líder do PP trabalhará por outras absolvições

Indiferente ao grito das ruas, o líder do PP na Câmara, deputado Mário Negromonte (BA), avisa que trabalhará pela absolvição dos dois liderados nesta quarta-feira: Pedro Henry (MT) e o presidente do partido, Pedro Corrêa (PE). Negromonte não dá importância ao crime de caixa dois.

¿ Se o próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não cassa, por que o plenário da Câmara vai cassar? ¿ diz o líder do PP.

Num desabafo com amigos, o presidente da CPI dos Correios, Delcídio Amaral (PT-MS), disse:

¿ Do jeito que vai, no fim da CPI vamos ter que fazer uma homenagem ao Marcos Valério.

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