Título: ALCKMIN BATE SERRA E É LANÇADO
Autor: Flávio Freire e Adauri Antunes Barbosa
Fonte: O Globo, 15/03/2006, O País, p. 3

Prefeito, sem apoio interno, desiste e não comparece ao anúncio do candidato tucano

Disposto a levar sua candidatura até as últimas conseqüências, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, ganhou a queda-de-braço contra o prefeito José Serra e foi anunciado ontem candidato do PSDB à Presidência da República. Em meio a um arrastado processo de negociação interna, Alckmin obteve o aval do comando partidário depois de uma conversa decisiva com Serra, na hora do almoço, no gabinete do prefeito. Um dia depois de dizer que poderia renunciar ao mandato de prefeito desde que fosse aclamado para disputar a sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sem realização de prévias, Serra recuou diante de um governador convicto, que não abriu mão de sua candidatura e ainda ameaçou levar a disputa para a convenção.

¿ Só o partido, como um todo, me tiraria dessa disputa ¿ disse Alckmin, pouco antes de ser anunciado oficialmente candidato num ato que reuniu o comando do PSDB, governadores e líderes do diretório estadual tucano. Serra, porém, não apareceu.

Improvisada no quintal dos fundos da sede do diretório estadual do PSDB, a festa em torno de Alckmin foi marcada ainda pela falta de discurso do ex-presidente Fernando Henrique.

Em nota, no início da noite, o prefeito de São Paulo procurou minimizar a rivalidade entre ele e o governador paulista.

¿Meu senso de responsabilidade política leva-me a colocar acima de qualquer aspiração pessoal nosso objetivo comum: dar um novo rumo ao país. Por isso, e por considerar Geraldo Alckmin habilitado para vencer a eleição e ser o próximo presidente, cerro fileiras, com o partido, em torno de sua candidatura.¿

Enquanto Serra se isolava na sede da prefeitura, subiam no palanque para dar apoio a Alckmin o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, e os governadores Aécio Neves (MG), Marconi Perillo (GO), Lúcio Alcântara (CE), Cássio Cunha Lima (PB) e Simão Jatene (PA). O governador de Roraima, Otomar Pinto (RR), não compareceu à festa, mas ligou para parabenizar o colega. Diante de cerca de cem correligionários, Alckmin elogiou o prefeito:

¿ Quero fazer uma homenagem ao prefeito José Serra, um dos mais preparados homens públicos que, por conta de seu desprendimento, nos permitiu iniciar essa mobilização pela mudança ¿ disse o governador.

Entre partidários de Alckmin, a certeza é de que a campanha do governador à Presidência terá apelo junto às bases do partido, com quem Alckmin tem tido encontros desde julho passado, quando começou a costurar a candidatura em viagens pelo país.

Depois do anúncio formal, o governador foi recebido por Serra no início da noite na sede da prefeitura. Os dois tomaram café e conversaram por quase duas horas. O prefeito não quis falar com os jornalistas e permitiu acesso ao seu gabinete, por menos de cinco minutos, apenas a fotógrafos e cinegrafistas.

No último Datafolha, Serra teria 43% das intenções de voto no segundo turno, contra 48% para Lula. O desempenho de Alckmin é mais fraco: 35% para o tucano contra 53% do petista. Diante de sua melhor situação nas pesquisas, Serra procurou esticar a corda até o último instante, antes de jogar a toalha ontem, por volta das 14h. Anteontem, em mais uma tentativa de tentar prorrogar a decisão, o prefeito jantou com o triunvirato tucano ¿ Fernando Henrique, Tasso Jereissati e Aécio Neves ¿ num hotel de São Paulo levando na manga números de pesquisas.

No jantar, o prefeito admitiu a possibilidade de abandonar de vez a chance de concorrer à eleição presidencial, mas pediu nova conversa com Alckmin, a quem reapresentaria os argumentos sobre a preferência do eleitorado. Serra esperava que Alckmin desistisse.

¿ No caso do Serra, para abrir mão sem ir para uma disputa, tem que ter um desprendimento muito grande. A preocupação dele era que uma disputa pudesse gerar um mal-estar que faria com que o partido saísse dividido ¿ disse Tasso Jereissati.

O que o prefeito não esperava ontem era a reação de líderes tucanos que aterrissaram em São Paulo criticando sua estratégia de tentar impor a candidatura com a condição de o partido não estabelecer prévias ou outro tipo de consulta.

Os governadores Lúcio Alcântara (Ceará) e Cássio Cunha Lima (Paraíba) foram os primeiros a jogar um balde de água fria sobre as intenções do prefeito. Cássio Cunha Lima chegou a dizer que, diante das circunstâncias, Alckmin tinha mais condições de ser indicado.

¿ O prefeito tem declarado que está à disposição do partido, mas não concorda com prévias ou outro mecanismo de consulta. Por outro lado, Alckmin tem mantido sua candidatura. Teremos o desfecho ainda hoje com a indicação de que Alckmin tem mais chance de ser o escolhido ¿ disse o governador paraibano, antes do anúncio oficial.

Ao anunciar a escolha do governador, Tasso afirmou:

¿ Quero falar que, apesar da minha credulidade, sei que muita gente não acredita num entendimento. Mas eu sabia que isso seria possível porque estamos lidando com dois homens de alto nível. Não posso deixar de enaltecer o desprendimento de Serra, que tem todas as qualidades para ser o presidente do Brasil, mas que abriu mão de sua candidatura para evitar disputa interna.

O presidente do PSDB aproveitou o anúncio para atacar o PT e o governo Lula:

¿ Entendo que para o Brasil o importante é que não fique entregue ao PT e a essa desgovernança e falta de ética.

Tasso tentou minimizar a divisão:

¿ Queria declarar a todos os tucanos que, com a indicação do Alckmin, o partido está unido e motivado para recuperar o poder.

¿ O que prevaleceu foi o interesse maior do nosso país e nossa responsabilidade pela unidade ¿ completou o governador Aécio.

O governador deverá deixar o governo de São Paulo no próximo dia 31, renunciando ao cargo para enfrentar Lula em outubro. Em seu lugar assumirá o vice, Cláudio Lembo, do PFL. Antes, porém, Alckmin pretende inaugurar uma série de obras de grande impacto, como uma nova linha do metrô e o aprofundamento da calha do Rio Tietê, com as quais quer ocupar espaço na mídia como empreendedor.

O DISCURSO DO CANDIDATO E A REPERCUSSÃO da página 4 à 9