Título: BC MANTÉM RITMO E TAXA BÁSICA CAI PARA 15,75%
Autor: Patricia Duarte, Patricia Eloy e Ronaldo D'Ercole
Fonte: O Globo, 20/04/2006, Economia, p. 25

Especialistas afirmam que preocupação com aumento dos gastos públicos deve impedir queda mais acelerada dos juros

BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO. O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu ontem reduzir em 0,75 ponto percentual a taxa básica de juros (Selic), que passa a ser de 15,75% ao ano, o mesmo patamar de março de 2001, como esperava o mercado. Foi o terceiro corte seguido com a mesma intensidade e o sétimo desde que a autoridade monetária começou a reduzir a Selic, em setembro passado. A decisão foi unânime e, para especialistas, reflete a avaliação de que o Banco Central (BC) continua optando pela cautela, ainda mais com a piora do cenário externo e a atenção à condução da política fiscal.

O BC apenas informou que continuará acompanhando ¿a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião, para definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária¿.

A disparada nos preços do petróleo no mercado internacional, com o barril no patamar histórico de US$73,73, deixa o mercado em alerta, mas não chega a levá-lo a rever suas projeções de inflação. Pelo relatório Focus desta semana, os analistas projetam que o IPCA encerrará o ano a 4,43%, abaixo da meta do governo, de 4,5%.

Os maiores gastos do governo nestes primeiros meses, no entanto, começam a incomodar. Para especialistas, a aceleração das despesas neste ano eleitoral pode levar a algum descontrole das contas públicas. O governo tem como meta um superávit primário (receitas menos despesas, sem contar o gasto com juros) de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas no país) neste ano. Até fevereiro, último dado disponível, ele estava em 4,38% do PIB em relação aos 12 meses anteriores, abaixo dos 4,84% vistos em 2005 todo.

¿ Há um certo desconforto (do mercado) com a política fiscal, que está sendo afrouxada neste início do ano ¿ avaliou o economista-chefe da corretora Fator, Vladimir Caramaschi.

Para a maioria dos analistas, o Copom manterá a trajetória de queda de juros, de 0,75 ponto percentual, na próxima reunião, nos dias 30 e 31 de maio. Se isso acontecer, a Selic de 15% ao ano passará a ser a menor da História, inferior aos 15,25% anuais que valeram entre janeiro e fevereiro de 2001.

Empresários e trabalhadores criticam decisão do Copom

Para Solange Srour, economista-chefe da Mellon Global, deve ser crescente a preocupação do BC com a política fiscal e um eventual aumento de demanda, o que pode gerar um maior conservadorismo na condução da política monetária:

¿ Teremos um grande estímulo para a demanda agregada no segundo trimestre. Há o reajuste do salário-mínimo e também o dos servidores, o que aumenta a renda disponível das famílias ¿ disse Srour.

¿ Deve ocorrer ainda uma piora no quadro externo, com uma queda nos níveis de liquidez, além das preocupações com a questão fiscal. Por tudo isso, o BC deve ser conservador e, talvez, a Selic não caia para menos de 15% este ano ¿ afirmou José Alfredo Lamy, sócio da Cenário Investimentos.

A redução de ontem novamente foi alvo de críticas de empresários e trabalhadores. Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, as ¿doses homeopáticas¿ são insuficientes para fazer frente à letargia em que se encontra a economia. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, também lamentou a decisão de não acelerar o ritmo de queda.

João Felício, presidente da central Única dos Trabalhadores (CUT), disse ser lamentável o ritmo ¿anêmico¿ de queda dos juros. O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, classificou a decisão de extremamente tímida e insuficiente para animar a produção.

Cálculo da Associação nacional dos Executivos de Finanças (Anefac) mostra que, com o corte, a taxa média de linhas como cheque especial, crédito direto ao consumidor, cartões de crédito e empréstimos pessoais, que estava em 7,54% ao mês (139,24% anuais), deve cair somente 0,66%, para 7,49% (ou 137,91% ao ano).