Título: `A amizade virou crime¿, diz compadre de Lula
Autor: Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 21/04/2006, O País, p. 8

Provocado por Suplicy, amigo do presidente fala aos senadores sobre a casa que emprestou ao petista em 1988

BRASÍLIA. Um dos mais próximos amigos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o advogado Roberto Teixeira depôs ontem na CPI dos Bingos e negou que tenha participado de qualquer esquema de arrecadação de dinheiro para o PT junto a prefeituras do partido no interior de São Paulo. Munido de um hábeas-corpus que lhe assegurava o direito de ficar calado diante de pergunta que pudesse incriminá-lo, Teixeira falou, pela primeira vez em detalhes, de sua amizade com Lula. Apesar da decisão judicial a seu favor, o advogado não deixou de responder a qualquer pergunta.

Roberto Teixeira foi acusado na CPI pelo ex-petista Paulo de Tarso Venceslau de comandar um esquema que levantava fundos para o PT a partir da prestação de serviços da Consultoria para Empresas e Municípios (Cpem). Ele negou qualquer vínculo com a empresa e disse que jamais esteve na sua sede. Uma das prefeituras em que Teixeira teria atuado era a de São José dos Campos, no início dos anos 90. A então prefeita era a hoje deputada federal Ângela Guadagnin (PT-SP).

¿ Eu nunca coloquei os pés na prefeitura de São José dos Campos. Desafio qualquer um a provar o contrário. Tentem achar uma ex-secretária ou um ex-motorista que tenha me visto lá. Não vão encontrar ¿ disse Roberto Teixeira.

Casa para Lula foi pedido do PT

O advogado confirmou que é compadre de Lula. Ele é padrinho de Luiz Cláudio, um dos filhos do presidente. Foi o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) quem levou Teixeira a tratar da relação com Lula.

¿ Conte tudo, Teixeira. Como iniciou sua amizade com o presidente e fale de seus atos de generosidade com Lula. Não há crime nisto ¿ disse Suplicy.

Senadores da oposição, que até então não tinham tratado desse assunto, chegaram a rir da iniciativa de Suplicy, já que eles mesmos evitavam o tema até então. Teixeira falou também da casa de sua propriedade, em São Bernardo do Campo, que emprestou para Lula morar durante oito anos, a partir de 1988. O presidente não pagou aluguel nesse período.

¿ Era início da campanha presidencial. O comando do PT me pediu que buscasse uma casa segura para Lula morar. Até então, ele vivia numa casa do BNH, muito próxima da rua, onde as pessoas entravam à vontade. Ficava vulnerável. Tinha aquela casa desocupada e cedi. O Lula não queria mudar. Achava um absurdo, mas era uma determinação do PT.

O advogado disse que sua amizade com Lula teve início em 1981 e que as relações foram se tornando mais próximas com o passar do tempo. Ele comentou a relação de compadrio com Lula.

¿ Fui padrinho do Luiz Cláudio com muito orgulho. O nordestino tem um apreço por essa relação de compadrio. É um segundo pai para o resto da vida.

Apesar de se sentir orgulhoso de ser padrinho do filho do presidente, Teixeira disse que fica incomodado com a imprensa que só o identifica como ¿compadre do presidente¿. Na década de 90, ele chegou a entrar na Justiça para proibir um jornal paulista de fazer essa referência a ele.

¿ Tiraram a minha personalidade. Como se esta fosse a única forma de me identificar. Como se meu nome fosse ¿Roberto compadre de Lula e que emprestou a casa Teixeira¿. Minha amizade com Lula virou acusação de crime.

A oposição centrou suas críticas num documento da Comissão Especial do PT criada para apurar as denúncias de Venceslau contra Teixeira. Venceslau levou a denúncia a Lula, no início da década de 90, quando o hoje presidente da República comandava o PT. Lula pediu a Paulo Okamotto que apurasse as acusações de Venceslau.

O PT criou uma comissão composta pelo economista Paul Singer, pelo jurista Hélio Bicudo e pelo hoje deputado federal José Eduardo Cardozo.

Oposição ironiza Eduardo Suplicy

Nas suas conclusões, os três apontavam responsabilidade de Teixeira. Mas o advogado recorreu ao Diretório Nacional do PT, que desconsiderou o trabalho da comissão, inocentou Teixeira e expulsou Venceslau da legenda.

Os senadores da oposição acusaram Teixeira de ter se beneficiado da amizade de Lula e, por isso, ter conseguido bons clientes para seu escritório de advocacia. Ele negou que isso tenha ocorrido e afirmou que, por ser muito próximo de Lula, ficou distante do governo, assim como da família do presidente.

¿ Duvido que alguém encontre, no curso do governo Lula, alguma bondade que eu tenha obtido. Nunca pedi e nunca me ofereceram nada. Não tenho favorecimento nenhum e nunca indiquei ninguém ¿ disse Teixeira.

Durante o depoimento, Eduardo Suplicy ainda perguntou a Teixeira que conselho ele dava nesse momento a Lula e ao PT. Os senadores da oposição não perderam a deixa.

¿ Diga o seguinte: Presidente Lula, olha o que acontece a seu redor. Peça para seus ministros pararem de roubar ¿ disse o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

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