Título: QUEM TE VIU, QUEM TE VÊ
Autor: Maria Lima/Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 25/05/2006, O País, p. 9

Lula, que hoje é só elogios, já chamou Sarney de grileiro e molecão

Se o clima de elogios, afagos e mea-culpa que rege a convivência atual entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o senador José Sarney (AP) pedisse trilha sonora, a música-tema seria inevitavelmente "Quem te viu, quem te vê". Lula disse anteontem que nunca fez ofensas pessoais a Sarney, mas quando era somente um líder de oposição, tinha o costume de empregar artilharia pesada contra o peemedebista. Especialmente quando Sarney era o inquilino da cadeira ocupada agora pelo petista. O presidente que foi ao céu da popularidade com o Plano Cruzado, para depois padecer no inferno da hiperinflação, era um dos alvos prediletos de seu hoje aliado sucessor.

Pouco depois de Sarney assumir o cargo com a morte de Tancredo Neves, Lula, num discurso de improviso, chamou-o, sem meias palavras, de grileiro.

- A impressão que tenho é de que ele é um dos maiores latifundiários do Maranhão. Como presidente ele tem direito de negar, mas o fato é que a História deste país é rica em grilagem - disparou.

Ainda antes da primeira eleição direta pós-ditadura, em maio de 1987, o Lula de barba escura e farta não economizava na pancadaria.

- O presidente Sarney perdeu totalmente a representatividade interna e externa. Foi eleito como suplente por um Colégio Eleitoral repudiado pela opinião pública. Ele, pelo que se acompanha, não tem controle do PFL, não tem influência no PMDB, não tem aceitação dos outros partidos - atacava.

Dois meses depois, voltou à carga.

- Se tiver que analisar as responsabilidades de um presidente apenas pelo papel de Sarney e Figueiredo, posso garantir que tenho condições de governar. Embora eles tenham diplomas que eu não tenho, exerceram muito mal esse papel.

No fim do ano, concentrou-se na eleição indireta que consagrou o atual amigo:

- Se disputasse uma eleição, os votos do Sarney não dariam para encher um penico.

Na campanha em que acabou derrotado por Fernando Collor, Lula aumentou o calibre dos ataques. Já com metáforas futebolísticas, um dos poucos traços do estilo que sobreviveu à chegada ao poder:

- Ele fez do governo uma brincadeira de moleque, está agindo como um molecão que, dono da bola, acaba com o jogo quando leva um gol. Sarney vale o mesmo que um chaveirinho.

Em 1994, o adversário era Fernando Henrique, mas numa referência à relação com o Congresso, sobrou para o senador.

- Tivemos o autoritarismo e depois a inoperância do Sarney, que preferiu o "é dando que se recebe".