Título: Fazendo as contas
Autor: Míriam Leitão
Fonte: O Globo, 02/09/2006, Economia, p. 40

Quando chegarem os dados do crescimento do PIB do terceiro trimestre, a notícia será melhor que a divulgada esta semana, mas o ano já está condenado. O Brasil terá, de novo, baixo crescimento. Projeções feitas pelo consultor Alexandre Marinis mostram que, para atingir os 3,5% que o mercado está prevendo, a economia tem que crescer, nos últimos dois trimestres, igual ao momento de maior vigor do governo Lula.

Para crescer este ano o que está sendo previsto pelo mercado, os 3,5%, o país teria que crescer, segundo Marinis, a uma taxa de 1,6% nos dois últimos trimestres, ou seja, do segundo para o terceiro e do terceiro para o quarto. ¿Esse ritmo de crescimento de um trimestre para o outro equivaleria ao observado no final de 2003 e início de 2004, quando a economia retomava um crescimento vigoroso que não parece se repetir agora.¿

Nas próximas semanas, a média das previsões do mercado vai continuar caindo. Está agora em 3,5%, mas permanecerá em queda. O resultado do PIB provocará várias reduções da previsão de crescimento. Principalmente pela queda do investimento.

Para crescer os 4% previstos ainda pelo Banco Central, o país teria que crescer 2,2% no terceiro e no quarto trimestre, o que só aconteceu no auge do Plano Real. Para atingir os 4,5% previstos no Orçamento de 2006, precisaria de um crescimento de mais de 2,8% por trimestre. Se o crescimento do PIB no resto do ano for equivalente à média histórica de 1991 ao segundo trimestre de 2006, que é de 0,72% por trimestre, o país crescerá apenas 2,83% este ano. Se repetir o mesmo crescimento médio do governo Lula, ou seja, 0,64% por trimestre, terminará o ano crescendo somente 2,77%.

O Credit Suisse, que já apostava em crescimento em torno de 3%, hoje acredita que há mais probabilidade de ser menos que isso. O Itaú acha que é razoável esperar uma aceleração no terceiro trimestre deste ano para algo perto de 1%. ¿Mas, mesmo que isso aconteça e o crescimento do quarto trimestre também seja alto, o crescimento de 2006 provavelmente ficará entre 3% e 3,4%¿, diz o Informativo Semanal do Itaú.

O gráfico abaixo, elaborado pela GAP Asset, mostra o PIB acumulado em 12 meses. O último dado, que considera os dois últimos trimestres de 2005 e os dois primeiros de 2006, mostra que, no período, o crescimento foi de 1,7%. No entanto, o consumo das famílias, empurrado pelo aumento da renda e pelo crédito fácil, vem crescendo acima dos 3% há oito trimestres (agora, por exemplo, está em 3,5%). ¿Temos um paradoxo: a sensação térmica da população em geral é bem mais positiva do que os dados de PIB sugerem, o que explica a popularidade do governo, apesar do PIB¿, diz Alexandre Maia, da GAP.

Na visão dele, o resultado do PIB deixa claro as assimetrias atuais da economia. Enquanto vão bem o consumo das famílias e áreas como mineração, petróleo e construção civil, há setores que, com o impacto do câmbio, vão muito mal, como calçados, móveis e têxteis, sem falar em alguns produtos do agronegócio.

A previsão da GAP é que, este ano, o crescimento do consumo seja bem superior ao crescimento do PIB. O primeiro ficaria em 4% e o PIB, em 3%.

Uma das razões de este ser um ano decepcionante é, sem dúvida alguma, a taxa de juros. Se a inflação está bem abaixo da meta, se o PIB está menor até do que o Banco Central havia projetado, está claro que houve erro de dosagem da política monetária.

Mas certamente o BC não é o único culpado. A política fiscal do governo é desestruturante. O gasto cresceu além do aumento da arrecadação, o que indica que novo aumento de arrecadação terá que haver no futuro. A explicação do governo de que não foi a carga tributária que cresceu, mas, sim, a Receita que arrecadou mais é tosca. Primeiro, porque houve mudanças que implicaram elevação de impostos; segundo, porque a arrecadação aumentou além do crescimento do PIB; terceiro, porque o mais preocupante é o ritmo constante de aumento de despesas, permitindo projetar novos aumentos de carga tributária no futuro.

Os dados do PIB divulgados esta semana foram piores que o esperado porque ficou claro que uma das razões do fraco desempenho é a queda do investimento. O país está crescendo pouco, e a queda do investimento indica que continuará crescendo pouco no futuro. Há vários desequilíbrios na economia brasileira que não têm sido enfrentados e, por isso, o número ruim da semana não é apenas um episódio, mas um sintoma de uma economia que não consegue reencontrar o caminho do crescimento sustentado. Continua avançando menos do que pode e precisa.