Título: Cartão vermelho
Autor: JORGE BORNHAUSEN
Fonte: O Globo, 28/09/2006, Opiniao, p. 7

Para usar uma metáfora futebolística - única linguagem em que ele consegue se fazer amplamente entendido - Lula cometeu uma falta no jogo eleitoral para a qual as regras não admitem meio-termo: cartão vermelho, expulsão do campo. (Ou, como estabelece a lei nº 9.504, cancelamento do "registro da candidatura" ou cassação do diploma de presidente da República, caso tenha sido eleito.) A Justiça Eleitoral decidirá e o processo já começou.

Como diz o bordão do comentarista de arbitragem Arnaldo Cezar Coelho, "a regra é clara".

A falta de Lula - no caso, o crime eleitoral - está caracterizada pelo fato de o seu assessor especial (homem da sua confiança direta, com gabinete ao lado do seu no Palácio do Planalto) ter usado "recursos financeiros para pagamento de gastos eleitorais" que não provenham da conta específica de campanha.

(O dinheiro - mais de R$1,7 milhão que a Polícia Federal apreendeu, mas que ainda não sei por que não exibiu, como sempre fez em situações semelhantes - destinava-se à operação suja da campanha de Lula, mas segundo o presidente do PT não saiu do caixa do partido...)

A Justiça Eleitoral - no papel do juiz que vê um jogador cometer falta gravíssima e apita no ato e se dirige ao infrator - não tem outra saída a não ser dar o "cartão vermelho".

Lula parecia destinado à impunidade porque desferia golpes baixos (com destaque para as clássicas "cotoveladas", além de todo tipo de jogadas desleais) fora das vistas do árbitro. Agora, foi flagrado e não tem saída.

Não pode alegar que não tem nada com isso, já que seu assessor Freud - que nome perfeito para protagonista de um escândalo político! - não é um mero funcionário mas alguém por quem Lula bota a mão no fogo. (Pelo menos garantiu ao ministro da Justiça, que divulgou a informação pela TV, que não admite a culpa do colaborador amigo, embora a culpa não seja uma simples denúncia, mas uma constatação, culpa que não inspira dúvidas.)

Evidentemente, reagirá a opinião pública, os eleitores, que vinham sendo ludibriados com uma campanha de mentiras e falsidades (por exemplo: a paternidade do Bolsa Família assumida por Lula é mero golpe de marketing, pois ele apenas agrupou programas existentes e criou uma marca de fantasia).

Lula também se aproveitava do esquecimento de crimes de corrupção do seu governo, que o obrigaram a demitir ministros indiciados em inquéritos policiais e denúncias judiciais - José Dirceu, Casa Civil; Palocci, Fazenda; Humberto Costa, Saúde; e outros amigos e colaboradores.

Jogador malandro, como ele acha que é, sabe driblar as regras. Mas, presidente da República - e principalmente, candidato à reeleição - está exposto a observação e processos que não consideram escamoteações ou falsos álibis.

Como indicam seus partidários - queixando-se, ora de "estupidez e cretinices" dos operadores petistas, ora de pôr em risco uma "eleição que estava ganha", como falou o senador Mercadante - trata-se de um suicídio eleitoral. Embora desfiem argumentos de perdedores, estão certos.

Para a oposição, a questão é menos dramática. O que se pretende, imediatamente, é que a justa indignação da opinião pública transforme o segundo turno (que deveria ocorrer independentemente do episódio do suborno dos sanguessugas) das eleições presidenciais num confronto livre das escamoteações e do arsenal de golpes baixos que até agora beneficiaram Lula nas pesquisas. Confronto onde os eleitores vão decidir entre a ética de Geraldo Alckmin e a corrupção de Lula. E, para continuar com os jargões do futebol, "que vença o melhor".

é senador (PFL-SC).