Título: Modo de fazer
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 28/11/2006, O Globo, p. 2

Os ingredientes certos não garantem um bom prato se o modo de fazer não for seguido corretamente. Com uma penca de partidos pode-se fazer uma coalizão ou um mero ajuntamento político, como fez o governo Lula no primeiro mandato. A receita que agora Lula e o ministro Tarso Genro estão seguindo pode até não dar em nada, mas é algo diferente do que já foi tentado.

Se der certo, a experiência acabará sendo até pedagógica, pois, enquanto tivermos este presidencialismo com multipartidarismo, os presidentes terão de governar em regime de aliança partidária. Collor não entendeu isso, ficou sem pé no Congresso e afundou. Itamar Franco montou um amplo condomínio partidário em torno de um modesto programa de transição, do qual resultou o mais importante dos planos econômicos, o Real. FH governou com a mesma coalizão que o elegeu e reelegeu (PSDB-PFL), não tendo tido, por isso, a necessidade de construir uma coalizão no pós-eleitoral, como faz Lula agora. No roteiro proposto pelo ministro Tarso Genro, os partidos que ingressarem firmarão compromissos públicos sobre um programa mínimo, o que, por si só, já é um avanço em relação aos conchavos. O ingresso deve ser aprovado pela direção nacional de cada partido. Eles vão compartilhar o governo, obviamente, e passarão a integrar um conselho político, bem à moda do que acontece no regime parlamentarista. Alguns partidos, por razões internas, como a falta de unidade, terão apenas bancadas governistas. É o que acontecerá com o PTB e o PRB, ex-PL, e talvez com o PP, a depender do resultado de sua convenção do dia 12, para trocar a velha direção, marcada pelo escândalo do mensalão.

¿ Estamos fazendo e aprendendo, inspirando-nos na experiência parlamentarista, mas sem perder de vista as peculiaridades do presidencialismo ¿ diz o ministro Tarso Genro.

Com o PMDB, as coisas andam. O ingresso do partido na coalizão deve ser aprovado pela executiva e pelo conselho político. O almoço de hoje, reunindo caciques das duas alas, fala dessa unidade vislumbrada, a ser ainda confirmada pela prática.

Hoje acontece também a reunião com o PDT. Estarão com Lula e Tarso o presidente do partido, Carlos Lupi, o secretário-geral, Manoel Dias, o líder na Câmara, Miro Teixeira, o líder no Senado, Osmar Dias, e o governador eleito do Maranhão, Jackson Lago. Há resistências localizadas, mas a maioria prefere o ingresso formal na coalizão.

Já o PV desmarcou o encontro que teria hoje com o presidente. Embora a bancada toda, com exceção de Gabeira, tenha optado pelo apoio ao governo, alguns dirigentes querem negociar primeiro alguns pontos de política ambiental, como a redução das emissões de CO2. Alfredo Sirkis, por exemplo, prefere um compromisso de apoiar uma certa agenda do governo ao ingresso na coalizão.

Na próxima semana, Lula conversa com o PCdoB e o PSB, velhos aliados que serão membros plenos da coalizão. Pelo que está esboçado, se for bem costurada, ela garantirá a Lula um conforto político na Câmara de que ele não desfrutou no primeiro mandato. O Senado continuará complicado. E o primeiro teste na Câmara já se avizinha, a eleição de seu presidente. A coalizão nascerá morta, ou gravemente ferida, se tiver mais de um candidato. Isso é o que PT ouviu ontem.