Título: O ano da publicidade
Autor: Regina Alvarez e Carolina Brígido
Fonte: O Globo, 03/12/2006, O País, p. 3

Em período eleitoral, gastos do governo com propaganda aumentaram 38,1% em relação a 2005

No ano eleitoral, em que uma bem-sucedida campanha conseguiu garantir ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva mais um mandato de quatro anos, o governo aumentou 52% acima da inflação os gastos com publicidade, comparados com 2002, quando o então candidato governista foi derrotado nas urnas. Essas despesas chegaram a R$337,2 milhões entre janeiro e outubro deste ano, quando no mesmo período de 2002 somavam R$221,7 milhões, já corrigidos pela inflação do período. Em relação a 2005, os gastos do governo com publicidade cresceram 38,1% acima da inflação, nos dez primeiros meses do ano, mesmo com as restrições impostas pela lei eleitoral à publicidade institucional e outras formas de propaganda oficial.

De janeiro a outubro de 2005, o Executivo gastou R$244,1 milhões com publicidade, já considerando valores corrigidos pelo IPCA. Em 2006, o governo concentrou seus gastos no primeiro semestre, porque a lei eleitoral impede a veiculação de publicidade institucional nos três meses antes do pleito. Mas, ainda assim, considerando os gastos totais registrados no Orçamento até outubro com a divulgação das ações do governo ¿ publicidade institucional, de utilidade pública, produção de material gráfico, entre outros ¿ as despesas superaram o montante de 2005.

O levantamento ¿ feito pela consultoria técnica de Orçamento da liderança do PFL no Congresso, com base nas informações do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) ¿ mostra também que os gastos com publicidade realizados pela Presidência da República, nos primeiros dez meses do ano, chegaram a R$181,3 milhões, 37,4% além do valor pago no mesmo período de 2005, quando essas despesas foram de R$131,9 milhões, já corrigidos pela inflação.

Se comparados com as despesas da Presidência no mesmo período de 2002 (R$44,8 milhões), o aumento real chega 304,6%. Mas, neste caso, este aumento não pode ser considerado real, pois a base de comparação não é a mesma, já que o governo Lula decidiu centralizar toda publicidade institucional na Secretaria de Comunicação (Secom), ligada à Presidência da República, o que não acontecia no governo anterior.

Especialista aponta contradição do PT

O cientista político Leonardo Barreto, professor da Universidade de Brasília (UnB), considera que existe uma contradição clara entre o discurso adotado pelo PT na gestão de Fernando Henrique Cardoso, contra gastos excessivos com publicidade, e a prática do governo Lula. Mas destaca que essa é uma postura de todos os governos e não apenas do atual.

¿ No período eleitoral, as pessoas associam os governantes ao candidato. Então, fazer propaganda para o Estado é fazer propaganda para os ocupantes dos cargos, e o contribuinte acaba pagando a conta ¿ afirma Barreto.

Na visão de Barreto, o Congresso teria que discutir um limite para esses gastos, no âmbito da reforma política.

¿ O Congresso tem que regulamentar essas despesas para evitar abusos. A gente não pode esquecer que a maior parte dos escândalos de corrupção do ano passado estiveram ligados a gastos com publicidade ¿ diz Barreto.

Para o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), o correto seria proibir gastos com publicidade um ano antes do processo eleitoral.

¿ Do jeito que está, é desperdício de dinheiro. Mas isso não é exclusividade do governo Lula. Em muitos municípios e governos estaduais se joga dinheiro fora com publicidade e a população paga por isso ¿ afirma o líder.

Já o vice-líder do governo na Câmara, deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), defende a divulgação das ações do governo através da publicidade, mesmo em época de eleição:

¿ Acho que a publicidade governamental é necessária, porque precisamos mostrar à população o que o governo faz. A publicidade é essencial para que a população conheça os benefícios a que tem direito. É necessária e importante. E o volume de investimento (em publicidade) está ligado ao número de programas.

Albuquerque argumenta que o governo tem ampliado os contatos de informação com a população, como é o caso da convocação para o recadastramento no INSS e informações sobre o Imposto de Renda. E esse contato é feito através da publicidade oficial.

¿ Aumentou muito a gama de prestação de serviços. Não existe outra forma de chegar à população ¿ afirma.

A Subsecretaria de Comunicação Institucional da Secretaria-Geral (Secom), que é responsável pela publicidade do governo, pediu um prazo até amanhã para analisar os dados recolhidos no Siafi e se manifestar sobre o levantamento.