Título: Cobertor curto encolhe pacote
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 27/12/2006, Economia, p. 19
Corte de impostos perde R$4 bi devido, principalmente, a reajuste do mínimo e correção do IR
Opacote do governo de desoneração para estimular investimentos e destravar o crescimento do país encolherá em R$4 bilhões, antecipou ao GLOBO um técnico da equipe econômica. Os incentivos em estudo, que inicialmente somavam R$12 bilhões (incluindo a aprovação da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas), não deverão passar de R$8 bilhões. Considerando que a Lei Geral representa uma renúncia de R$2,5 bilhões que já estava prevista nas contas do governo, os benefícios apenas do pacote caíram de R$9,5 bilhões para R$5,5 bilhões, ou seja, recuaram 42%.
Os cortes ¿ feitos principalmente por causa do reajuste do salário mínimo e da correção da tabela do Imposto de Renda (IR) acima do esperado, mas também para liberar recursos para investimentos em projetos estruturantes ¿ afetaram medidas importantes para o setor produtivo, como a ampliação do Regime Especial de Aquisição de Bens de Capital para Empresas Exportadoras (Recap).
Este programa prevê a suspensão da cobrança de PIS/Cofins na compra de máquinas e equipamentos por empresas que exportam, no mínimo, 80% de sua produção. O governo, que deve anunciar o pacote no fim de janeiro, pretendia reduzir esse percentual para 65%, ampliando o número de empresários beneficiados.
Também teve que ser descartada a redução, de 24 para 18 meses, do prazo para o aproveitamento de créditos de PIS/Cofins na compra de bens de capital. Esse benefício teria um custo de R$1,7 bilhão para os cofres públicos.
¿ O que estávamos imaginando desonerar sofreu um corte, é claro. (O pacote) ficou menor ¿ admitiu a fonte.
Proposta é tributar menos nos estados
A equipe econômica trabalha para cobrir R$1,1 bilhão de despesas extras com o reajuste maior do salário mínimo ¿ conforme acordo com as centrais sindicais ¿ para R$380 em 2007 e a correção da tabela do IR em 4,5% nos próximos quatro anos. Mas o corte do pacote terá que ser maior, pois será preciso realocar mais recursos para investimentos públicos em infra-estrutura ¿ área que atualmente é alvo de um planejamento estratégico dentro do governo, no contexto do pacote para destravar a economia brasileira.
Segundo o técnico do governo, a ampliação do Projeto Piloto de Investimentos (PPI), que subirá de 0,2% para até 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), será importante para injetar dinheiro em obras de infra-estrutura, mas não suficiente.
¿ O cobertor é curto. É claro que existem necessidades de investimento que serão supridas pelo PPI, mas isso não resolve a questão totalmente ¿ afirmou a fonte.
Segundo o técnico, no entanto, o governo conseguiu preservar no pacote medidas que são importantes para os investimentos do setor produtivo, especialmente na área de infra-estrutura. Entre elas está a redução, de 20 a 25 anos para apenas 18 a 24 meses, do prazo para aproveitamento de crédito de PIS/Cofins na compra de materiais da construção civil para novos empreendimentos. A medida é essencial a novos investimentos e custará R$2,3 bilhões.
¿ O cobertor é curto, mas conseguimos preservar incentivos para novas edificações (por exemplo, a construção de uma nova unidade por uma empresa). Essa é a mais expressiva das medidas de incentivo que estamos estudando ¿ defendeu uma fonte da equipe econômica.
Também ficou mantida no conjunto de medidas a ampliação do prazo para o recolhimento de PIS/Cofins e da contribuição previdenciária. A idéia, neste caso, é dar maior capital de giro às empresas.
O técnico destacou ainda que o governo vai continuar trabalhando para desonerar os investimentos não apenas na esfera federal, mas também nos estados e municípios por meio de uma nova proposta de reforma tributária:
¿ Algumas ações (como o Recap) tiveram que entrar na lista de espera, mas vamos continuar brigando para desonerar os investimentos, especialmente em infra-estrutura. Essa intenção continua.
FGTS é dúvida para fundo da habitação
Apesar disso, a redução do pacote não agradou em nada ao ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan. Na semana passada, ele protestou na frente do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante reunião para discutir o novo valor do salário mínimo. Ao ouvir do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que as desonerações ficariam limitadas diante do reajuste do piso, Furlan reclamou e acabou ouvindo do colega:
¿ Estamos juntos nessa ou não? Também não fiquei satisfeito com o aumento do salário mínimo. Todos têm que ceder um pouco.
Foi preciso o presidente da República interferir na discussão. Segundo fontes ligadas ao Palácio do Planalto, Lula acabou optando por dar um reajuste maior ao salário mínimo, por considerar que o impacto da medida seria mais intenso do que a divulgação de um pacote que vem sendo criticado antes mesmo de ser anunciado.
Na área fiscal, o pacote também deverá ser modesto. O governo trabalha com mais força para tentar limitar os gastos com a folha de pagamentos de Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas o principal problema, o descontrole da Previdência Social, será tratado com paliativos, uma vez que uma nova reforma foi descartada neste momento.
Já na área de habitação, uma das principais medidas do pacote, que prevê a criação de um fundo para subsidiar a prestação da casa própria para famílias de baixa renda, também encontra obstáculos. O ministro Mantega já havia anunciado que o fundo teria recursos do FGTS, mas isso já não é mais certo:
¿ Ainda não definimos uma forma de financiar o fundo. A discussão é cabeluda.