Título: Genocídio na saúde
Autor: Motta, Cláudio
Fonte: O Globo, 04/01/2007, Rio, p. 12

Foi com essa palavra que o governador Sergio Cabral classificou o que viu ontem durante visita ao Hospital estadual Albert Schweitzer, em Realengo. Ele afirmou que a unidade representa o que há de pior em gestão hospitalar e quer que o Ministério Público seja chamado pela direção, para apurar as causas do mau atendimento e do desperdício de dinheiro público, além de determinar responsabilidades. A partir de hoje, 20 homens do Corpo de Bombeiros vão trabalhar, temporariamente, na limpeza do hospital, que presta na emergência 600 atendimentos por dia. Ontem, também como parte do esquema especial, foram recebidas quatro toneladas de medicamentos do Ministério da saúde, para abastecer por um mês a emergência. A Secretaria de saúde está fazendo um levantamento, ainda sem prazo para ser concluído, de todos os problemas da rede.

- É uma calamidade pública, estou chocado. Uma coisa é o criminoso matando inocentes. Outra é o estado cometer genocídio. O que o estado faz aqui é cometer assassinatos, com mais mortes do que na luta selvagem desses crimiosos. Esse é o conjunto do que há de pior que um ser humano pode fazer para destruir um hospital público. Com certeza o MP vai verificar as causas e tomar as previdências - disse Cabral.

Com a avaliação, Cabral faz uma crítica direta ao governo Rosinha. Acompanhado pelos secretários de saúde, Sérgio Cortes, e de Governo, Wilson Carlos, além do comandante dos bombeiros, coronel Pedro Machado, Cabral foi recebido, às 7h45m, pelo novo diretor do hospital, Cesar Fontes Rodrigues.

- A emergência pratica o atendimento de corredor. A limpeza tinha só dois funcionários - disse Cesar.

"É um verdadeiro caso de polícia"

A emergência estava superlotada, enquanto na enfermaria do sétimo andar havia 22 leitos disponíveis e apenas dois ocupados. O governador viu infiltrações e buracos nas paredes, sujeira, obras inacabadas e goteiras. A pacientes e funcionários, prometeu melhorar a qualidade do atendimento em menos de um ano.

- O que vi na emergência é um verdadeiro caso de polícia. As pessoas nos corredores, esperando hemogramas há dias, uma situação absolutamente insalubre, desumana. Médicos e enfermeiros fazendo um esforço sobrenatural para manter as pessoas vivas. O que a gente recebeu de informação na transição infelizmente é muito pouco perto da situação dramática encontrada - disse.

No almoxarifado, a comitiva ficou chocada com os alagamentos, os fungos e a falta de organização. Por falta de condições de armazenamento, material médico caro, como um sistema para dreno, estava inutilizado, apesar de ainda na validade. Um tomógrafo, na caixa há dois anos, também foi citado por Cabral para criticar a antiga gestão do hospital:

- Aqui não tem governo. O orçamento era de R$ 800 mil por mês. O problema não é dinheiro, é gestão.

A humanização do atendimento e o investimento na atenção básica serão prioridades para o secretário Sérgio Côrtes. Para evitar a superlotação, ele defende a transferência de pacientes para novos leitos nas enfermarias e para o Hospital do Iaserj, que funcionaria como unidade de retaguarda.

- Não há por que ter enfermaria fechada e pessoas no corredor. Mas também temos que investir na atenção básica. Caso contrário, teremos eternamente que criar mais leitos e hospitais, quando o que precisamos é de mais gestão. Uma parte dos investimentos será para que os municípios aumentem a cobertura da atenção básica e do programa saúde da Família - afirmou.

O deputado Paulo Pinheiro (PPS), presidente da Comissão de saúde da Alerj, elogiou a vistoria do governador, mas disse que os problemas encontrados ontem são antigos:

- O MP tem 30 representações da Comissão de saúde da Alerj, sobre problemas na rede estadual. No Albert Schweitzer, o CTI precisa ser acabado e o tomógrafo, instalado.

Jorge Darze, presidente do Sindicato dos Médicos, disse que a unidade foi a única a ser visitada pelos últimos governadores, inclusive Rosinha Garotinho.

- A visita da Rosinha teve a mesma motivação da de hoje (ontem): a crise no atendimento. Fiquei animado, no entanto, com o fato de o governador falar em genocídio e omissão.

Gilson Cantarino, ex-secretário estadual de saúde, rebateu as críticas de Cabral. Cantarino reconheceu que há problemas, mas afirmou que foram investidos R$10 milhões em melhorias de 1999 a 2006. O ex-secretário disse ainda que o Albert Schweitzer não é espelho da rede estadual, citando o Hemo-Rio, e criticou o SUS.