Título: Após pacote, timidez nos juros
Autor: Duarte, Patricia e Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 25/01/2007, Economia, p. 25

BC corta menos a Selic, em só 0,25 ponto percentual, para 13% ao ano.

Dois dias depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciar o pacote que colocou a aceleração do crescimento como uma prioridade do seu segundo mandato, o Banco Central decidiu ontem diminuir o ritmo de corte da taxa básica de juros. Depois de cinco reuniões em que reduziu a Selic em meio ponto percentual, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, desta vez, fez um corte de só 0,25 ponto percentual na taxa, para 13% ao ano. A medida, na prática, diminui o impulso que vinha sendo dado à atividade econômica pela política monetária.

Enquanto empresários e alguns economistas vêem na decisão do BC uma postura contraditória ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) anunciado esta semana, outros analistas avaliam que a recente alta dos preços motivou o conservadorismo do Copom. Mas muitos avaliam que havia espaço para manter o corte mais intenso dos juros:

- As condições são as mesmas da reunião passada (em novembro) - afirmou o economista-chefe do BNP Paribas, Alexandre Lintz.

Assim como em novembro, a decisão do Copom não foi unânime. Cinco diretores do BC optaram pela redução de 0,25 ponto, enquanto três queriam que fosse repetido o corte de meio ponto. O comunicado final da reunião foi diferente do usual, com explicações mais detalhadas.

"Diante das incertezas associadas ao mecanismo de transmissão da política monetária, e considerando que os efeitos das reduções de juros desde setembro de 2005 ainda não refletiram integralmente na economia, o Copom avalia que a decisão contribuirá para aumentar a magnitude do ajuste a ser implementado", afirmou o texto.

- O BC sinalizou que o corte menor não significa o fim do processo de redução dos juros. Ao contrário, dessa maneira, ele pode ir além e, no fim do processo de ajuste da taxa, ter um patamar (de juros) menor ainda - interpretou a economista-chefe do ABN Amro, Zeina Latif.

Fiesp: decisão contradiz PAC

Essa foi a 13ª vez seguida que o BC cortou a Taxa Selic que, desde 2005, já foi reduzida em 6,5 pontos percentuais. Mesmo assim, o Brasil ainda tem o maior juro real (descontada a inflação do mundo): 8,6% ao ano.

Ao fazer o anúncio do PAC, Lula afirmou que "não entraria na Augusta a 120 quilômetros por hora", ou seja, que o crescimento econômico seria alcançado de maneira sustentável. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, por sua vez, cobrou publicamente, na ocasião, a continuidade do corte da Selic. Ele dirigiu-se ao presidente do BC, Henrique Meirelles, e afirmou que o mercado esperava a redução dos juros. Ontem, antes da reunião do Copom, o ministro alegou que havia feito apenas um "comentário jocoso" e reafirmou que o BC tem autonomia nas suas decisões.

Para o economista Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e hoje na Fundação Getulio Vargas, a decisão do Copom não é contraditória o objetivo do governo de acelerar o crescimento. Pelo contrário: Langoni avalia que o PAC foi um projeto conservador, que não cedeu ao populismo. Ele lembra que, no anúncio do programa, o ministro Mantega usou, em suas projeções, a mesma meta de inflação deste ano (4,5%) até 2010. O economista diz ainda que a decisão de ontem do Copom confirmou a autonomia informal do BC:

- Foi uma atitude coerente. A economia ganhou impulso no fim do ano passado e, agora, era de se esperar um maior gradualismo na redução dos juros.

Carlos Thadeu de Freitas Filho, do Grupo de Conjuntura da UFRJ, vê no corte menor dos juros uma reação à alta dos preços acima do esperado neste início do ano. Freitas Filho lembra que o BC, no seu último relatório de inflação, estimava que o IPCA ficaria em 1,1% no primeiro trimestre de 2007. Mas, com a alta de hortaliças e legumes por causa das chuvas, além dos reajustes de transportes públicos em São Paulo, a inflação deve subir 1,4% nos três primeiros meses deste ano, prevê Freitas Filho. Mesmo assim, ele acredita que o BC poderia ter reduzido mais os juros. Pelas suas estimativas, o IPCA deve fechar 2007 em apenas 3,7%. No relatório Focus, do próprio BC, o mercado calcula uma inflação de 4,07% este ano.

Alexandre Maia, da GAP Asset Management, também vê na decisão do BC uma reação à recente alta dos preços. Mas avalia que a maior cautela nos juros veio em boa hora:

- O cenário de inflação muito abaixo do centro da meta ficou para trás. Mas há espaço para novas quedas de 0,25 ponto.

Para o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, o Copom "desafinou".

- O recuo de 0,25 ponto é insuficiente para referendar a confiança dos setores produtivos no PAC e no discurso de crescimento pronunciado pelo presidente Lula - disse Skaf. - A retórica com pompa e circunstância do crescimento começa a derrapar precocemente - acrescentou.

A Firjan destacou a importância da continuar a redução dos juros. Já o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, lamentou a a decisão do BC.

- Pode ser um sinal invertido em relação a tudo que o governo pretende para criar um ambiente favorável à aceleração do crescimento.

Sindicato vê banho de água fria.

Para o presidente da Federação do Comércio Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), Abram Szajman, a Selic continua super dimensionada. O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, classificou a medida do Copom como "um banho de água fria no morno PAC":

- É impossível crescer 4,5% neste ano, como pretende o governo, com este excesso de conservadorismo.

O economista Reinaldo Gonçalves, da UFRJ, também acredita que a decisão do BC é incompatível com metas ousadas de crescimento:

- Isso pode colocar uma pá de cal nas perspectivas de sucesso do PAC, que corre o risco de ser a versão 2.0 do PPA (Plano Plurianual de Investimentos, lançado por Lula no início do seu primeiro mandato, em 2003): não passará de uma peça de publicidade que nunca sairá do papel.

SERVIDORES AMEAÇAM ENTRAR EM GREVE, na página 26