Título: Criminalistas são contra o aumento das penas
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 17/02/2007, O País, p. 11

SEGURANÇA: "Temos um sistema penitenciário precário, um dos piores do mundo", afirma Damásio de Jesus

Argumento de especialistas é que sistema prisional não comporta demanda maior e que caminho é a prevenção

Carolina Brígido

BRASÍLIA. O esforço do Congresso para aprovar rapidamente projetos que endurecem as penas contra criminosos pode não contribuir para a diminuição da violência no Brasil, na opinião de advogados especialistas em direito penal. O professor Damásio de Jesus, reconhecido no meio acadêmico como um dos maiores Criminalistas do país, acredita que deixar o condenado por mais tempo na cadeia pode ser até pior, porque o sistema prisional não tem condições de lidar com uma demanda ainda maior que a atual.

- Temos um sistema penitenciário precário, um dos piores do mundo. Exigir que o sujeito cumpra uma pena maior é ferir o princípio da dignidade humana, que consta da Constituição Federal. Não temos condições razoáveis sequer para o cumprimento das penas atuais - diz Damásio.

O presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri, defende posição semelhante. Assim como outros advogados, ele ressalta que é preciso investir mais na formação dos jovens, em vez de agir apenas quando já se transformaram em criminosos. Para Pansieri, a legislação penal brasileira já é eficiente. O problema é a falta de cumprimento dela.

- O endurecimento da legislação penal não vai mudar em nada a criminalidade no país. De nada adianta tirarmos de circulação as pessoas, porque elas vão voltar às ruas um dia. Precisamos é de escolas que mantenham os jovens ocupados por dez, 12 horas. Há algum tempo, as políticas sociais de inclusão não passam de retórica que disfarçam o mal que existe no Brasil. O direito penal não é a solução para as pessoas excluídas.

Toron: polícia bem equipada e combate à miséria

Os especialistas ouvidos pelo GLOBO concordam que a solução para a crise de segurança no país passa por políticas públicas de inclusão social e educação.

- A criminalidade não se reduz alterando lei. Pode mudar um milhão de vezes, vai continuar tudo na mesma. A fonte da criminalidade não é a legislação penal. A nossa legislação já é uma das melhores do mundo e não é ela que vai salvar o Brasil. Tem que se investir em educação, saúde, trabalho e condições sociais. E na garantia de punição - diz Damásio.

O advogado criminalista Alberto Toron comemorou a aprovação pela Câmara do projeto de lei segundo o qual um condenado por crime hediondo não pode obter progressão do regime - como, por exemplo, o semi-aberto - antes de cumprir dois quintos da pena em regime fechado. A exigência é para réus primários. No caso de reincidentes, o mínimo de pena para se cumprir em regime fechado passa a ser de três quintos. Toron ponderou, no entanto, que só medidas como esta não resolvem o problema da violência no Brasil.

- Há uma série de fatores quando se trata de redução da criminalidade, e o menos importante é o aumento da pena. Para vencer esse problema, é preciso manter as polícias bem equipadas nas ruas e não nos esquecer da miséria, um criadouro de criminosos - alerta Toron.

Juiz diz que agravante de usar menor não influirá

O juiz federal José Eduardo Leonel Ferreira, de são Paulo, afirmou que o projeto de lei que transforma em agravante de outros crimes o fato de ele ter sido cometido na companhia de menores não modificará muito o resultado dos julgamentos no país. Ele explicou que, na prática, os juízes não impõem penas que, somadas aos agravantes, sejam maiores do que a pena máxima do crime principal cometido. No caso de homicídio, em que a pena máxima é de 30 anos de prisão, se um menor participou do crime o agravante não influirá se o juiz tiver arbitrado a pena máxima ao réu.

- Colocar a participação do menor como agravante é bom, mas tem limitações no efeito prático. O ideal seria criar um crime específico, detalhando o que seria a corrupção de menores - argumentou Leonel Ferreira, que também tem um cargo de diretoria na Associação de Juízes Federais (Ajufe).