Título: La Paz em guerra contra a Fifa
Autor:
Fonte: O Globo, 29/05/2007, Esportes, p. 30

Evo Morales pede união de ¿irmãos¿ para derrubar veto a jogos acima de 2.500m.

LA PAZ

ABolívia está em crise. Desta vez, o motivo não é gás ou petróleo, nem separatismo, mas o futebol. Ontem, o presidente Evo Morales, com o apoio de políticos, como o prefeito de La Paz, Juan del Granado, e de dirigentes esportivos, anunciou uma campanha para tentar mudar a medida da Fifa, anunciada domingo, que proíbe jogos internacionais em cidades acima de 2.500 metros. A decisão atinge diretamente o país, pois a seleção boliviana tinha previsto, como sempre acontece, fazer as suas partidas pelas eliminatórias para a Copa de 2010 em La Paz, a 3.600 metros de altitude. Agora, terá que, possivelmente, jogar em Santa Cruz de la Sierra, ao nível do mar, e local da mais acirrada oposição política a Morales.

O presidente anunciou o envio imediato de uma delegação a Zurique, sede da Fifa, chefiada pelo presidente da Federação Boliviana, Carlos Chávez, e pediu uma ação conjunta de outros países afetados, como o Equador, que jogava em Quito (2.800m), e a Colômbia, que atuava em Bogotá, a 2.640m. Morales solicitou ajuda aos ¿presidentes-irmãos¿ de Argentina e Brasil.

¿ Este não é um veto somente à Bolívia e sim um veto à universalidade do esporte. O esporte é integração, saúde e educação, então é um veto também à integração, à saúde e à educação ¿ disse o presidente, após reunião de emergência com ministros e autoridades esportivas e departamentos (estados).

O prefeito de La Paz, Juan del Granado, deu apoio a Morales:

¿ Estamos aliados ao nosso presidente, às autoridades nacionais e aos departamentos para combater esta decisão discriminatória da Fifa ¿ afirmou Juan del Granado.

Jornais culpam Brasil pela proibição

Del Granado lembrou que em 1996 a Bolívia combateu com sucesso uma tentativa semelhante da Fifa, que entraria em vigor para as eliminatórias para a Copa da França, em 1998. Mas, na época, os bolivianos contaram com um reforço de peso: o presidente francês, Jacques Chirac. Com empresas francesas participando de uma série de processos de privatizações de serviços públicos, Chirac foi o principal defensor da manutenção dos jogos em La Paz, o que conseguiu.

Já o presidente da Federação Boliviana, Carlos Chávez, afirmou que recebeu a solidariedade de dirigentes de Uruguai, Paraguai e Venezuela. Já o Brasil e a Argentina, segundo ele, se mantêm neutros. Segundo o dirigente, a cautela de argentinos e brasileiros em declarar seu apoio à Bolívia seria em razão da possibilidade de que o Peru reafirmasse a decisão de jogar pelas eliminatórias para a Copa em Cuzco, o que também foi proibido.

¿ Esta é uma questão de estado que temos que administrar com inteligência. Tenho muita fé de que poderemos reverter e desvirtuar totalmente esse relatório da comissão médica da Fifa ¿ afirmou Chávez.

Além de La Paz, a decisão da Fifa atingiu quatro das nove capitais de estados da Bolívia: Cochabamba, Oruro, Potosí (4.000m) e Sucre.

O noticiário de todos os jornais bolivianos culpou Brasil e Argentina pela decisão e lembra que os dirigentes do Flamengo, que jogou em Potosí contra o time local, pela Libertadores, apelaram à Fifa sobre o assunto. A queixa de brasileiros vem de longa data. Na Copa América de 1979, Zico passou mal, sequer conseguiu deixar o hotel e desfalcou a seleção num jogo em La Paz. Nas últimas eliminatórias, no intervalo do jogo contra o Equador, em Quito, Ronaldo recorreu aos balões de oxigênio para voltar a campo.

Apesar dos protestos, a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) anunciou ontem que vai respeitar a decisão da Fifa, apesar de quatro de seus filiados (Bolívia, Equador, Colômbia e Peru) terem sido prejudicados:

¿ É uma determinação da entidade máxima do futebol e a Conmebol irá acatá-la. Cada um dos países afetado ficará responsável por fazer sua defesa e, se assim considerar, reclamar com a Fifa ¿ afirmou o secretário-executivo da entidade, Francisco Figueredo.

O dirigente disse que nenhum dos países ficará sem condições de realizar jogos internacionais:

¿ O Equador tem vários estádios com boa capacidade de público abaixo desta altitude, assim como a Colômbia tem Barranquilla e a Bolívia, Santa Cruz.

Além da altitude, os jogadores reclamam de jogos em horários de muito calor, como ao meio-dia no México, o que aconteceu na Copa de 1986, ou às 16h no verão do Rio, como ocorre no Brasileiro.