Título: Escândalo que envolve Roriz revelou, afirma a polícia, o 'vale-corrupção'
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 05/07/2007, O País, p. 4

SUCESSÃO DE ESCÂNDALOS: Transações são mais difíceis de serem detectadas.

Cartões corporativos são utilizados para saques de propina de até R$10 mil.

BRASÍLIA. As investigações da Operação Aquarela, que levaram o senador Joaquim Roriz (PMDB-DF) a decidir renunciar ao mandato, revelaram uma nova modalidade de suborno, batizado informalmente de vale-corrupção. Segundo investigadores do caso, empresas envolvidas nas ilegalidades descobertas estavam fazendo uso generalizado de cartões corporativos, com créditos de até R$50 mil, para pagar propina a envolvidos em fraudes sem deixar rastros no sistema financeiro. Os cartões eram entregues para as pessoas corrompidas, que faziam saques em valores abaixo de R$10 mil, sem serem identificadas e sem levantar suspeitas, já que as operações não envolviam dinheiro vivo.

Fraudes representam prejuízo de R$400 milhões

Pelos novos cálculos do Ministério Público do Distrito Federal, as fraudes investigadas na Operação Aquarela representam um prejuízo de aproximadamente R$400 milhões ao BRB, e não apenas de R$50 milhões, como se acreditava quando a apuração do caso se tornou pública, há cerca de duas semanas. O esquema, supostamente chefiado pelo ex-presidente do BRB Tarcísio Franklin, preso pela Polícia Civil do Distrito Federal, estaria em atividade há quase dez anos.

- Os cartões corporativos tornam o sistema financeiro ainda mais vulnerável a fraudes e facilitam a atuação das organizações criminosas - afirma o chefe da Delegacia de Repressão a Crimes contra o Patrimônio, Celso Ferro.

Só no cofre de uma das empresas investigadas pela Operação Aquarela, a polícia apreendeu mil cartões - com créditos de R$50 mil cada. Pelas informações da Polícia Civil, empresas fazem depósitos numa determinada conta movimentada pelos integrantes do esquema e repassam os cartões para que sejam feitos pequenos saques em várias agências bancárias, até um limite acertado previamente. Os pagamentos por meio de cartões substituiriam as transações com cheques, transferências bancárias ou o uso de doleiros, instrumentos cada vez mais visados nas investigações sobre lavagem de dinheiro.

O golpe surpreendeu a Polícia Civil, o Ministério Público do Distrito Federal e até as autoridades do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). A partir de um aviso recebido antes de a Operação Aquarela ser tornada pública, o Coaf descobriu os saques seriados feitos com cartões corporativos em poder de empresários e servidores públicos presos por supostas fraudes no BRB. A partir das constatações, o Coaf decidiu elaborar novas regras para o uso do cartão corporativo.

- Não se pode permitir que as pessoas tentem driblar a fiscalização fazendo saques dessa forma - disse um dos dirigentes do Coaf ao GLOBO.

Promotores e policiais descobriram o vale-propina ao investigar contratos firmados entre o BRB com ONGs e empresas de informática e de prestação de serviços, entre outros. São contratos de R$2 milhões a R$20 milhões que vinham sendo firmados pelo banco nos últimos anos, principalmente durante a administração de Tarcísio Franklin. O executivo foi flagrado numa conversa com Joaquim Roriz em que os dois discutem a partilha de R$2,2 milhões.

Tuma recebe documentos enviados pelo MP

O corregedor do Senado, Romeu Tuma (DEM-SP), recebeu ontem os documentos enviados pelo Ministério Público contendo dois CDs com gravações de conversas telefônicas e papéis relacionados com a operação triangular feita entre Roriz, o empresário Nenê Constantino e Tarcísio Franklin. Tuma enviou os CDs à PF para que fosse feita a degravação das conversas, e requereu outros cinco CDs e novos documentos, que ainda não são de conhecimento público e envolvem Roriz, obtidos pela Operação Aquarela.