Título: Política de idade mínima é vital à Previdência
Autor: Caetano, Marcelo e Mata, Daniel da
Fonte: O Globo, 20/07/2007, Opinião, p. 7

Os debates para uma reforma previdenciária reiniciaram e uns dos tópicos de discussão é a implantação da idade mínima para concessão de aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Há duas motivações para se estabelecer uma idade mínima de aposentadoria.

Em primeiro lugar, caracterizar o sistema previdenciário em seu aspecto fundamental de fornecer um seguro social à população em idade avançada, e não para faixas etárias com as quais as pessoas ainda estão em pleno vigor para o trabalho.

Em segundo lugar, os aspectos fiscais com uma potencial economia de recursos do sistema previdenciário, visto que os contribuintes sairiam mais tarde do mercado de trabalho e demandariam um menor tempo de pagamento de aposentadorias.

O presente artigo visa mostrar a importância da política de idade mínima, mas que a mesma somente será uma medida válida se conjugada com outros fatores que visem gerar incentivos à formalização nas relações trabalhistas e, da mesma forma, impedir a evasão de contribuintes.

Estipular idade mínima para aposentadoria tem o efeito tanto no lado dos gastos previdenciários quanto no lado arrecadatório. Há, entretanto, alguns efeitos de segunda ordem que são importantes e que não podem se desconsiderar no que tange à elaboração de novas regras previdenciárias. O primeiro aspecto é que os benefícios de risco, em especial os auxílios-doença e as aposentadorias por invalidez, costumam apresentar grande crescimento no seu fluxo de novas concessões posteriormente à adoção de regras mais rígidas para os benefícios programados. Nesse sentido, conjugado a uma possível adoção de idade mínima, deveriam se aplicar medidas de natureza administrativa que impedissem que os benefícios de risco se tornassem escapatória dos benefícios programados.

O segundo argumento, de natureza social, refere-se ao fato de que a mera adoção de uma idade mínima e a exigência de um elevado tempo de contribuição podem alijar do sistema previdenciário pessoas de renda mais baixa com maior dificuldade de acesso ao mercado formal de trabalho. Indivíduos esses que teriam dificuldade de ter um tempo de contribuição elevado em uma idade avançada e estariam, portanto, sem acesso aos benefícios previdenciários. Nesse sentido, deveria haver flexibilização do tempo de contribuição se adotado em conjunto com a idade mínima.

Daí, surge o terceiro argumento que vem exatamente de uma potencial redução de receita do sistema previdenciário devido à geração de incentivos inadequados no mercado de trabalho. Suponha, por exemplo, que a idade mínima seja 60 (sessenta) anos e o tempo de contribuição seja 35 (trinta e cinco) anos, por que um trabalhador contribuiria a partir da entrada no mercado de trabalho, algo, digamos, em torno dos 20 (vinte) anos de idade? Por que não ficar na informalidade nos primeiros anos e depois formalizar e iniciar a contribuição?

O esquema de (inadequados) incentivos oriundo da referida medida é mais grave quando se analisa desagregado por perfil socioeconômico do trabalhador, já que a classe menos abastada se insere mais cedo no mercado de trabalho e, portanto, é mais exposta à informalidade nas relações trabalhistas. Em outras palavras, em um ambiente atual com poucos incentivos e opções à formalização, haveria agravantes a prejudicar estatísticas mais favoráveis no que diz respeito à criação de trabalhos formais. E como a arrecadação previdenciária é oriunda da formalização das relações trabalhistas, haveria, como resultado, uma queda na futura arrecadação de contribuições.

O desafio que surge para os formuladores da política previdenciária é o de gerar incentivos corretos à formalização de maneira que a implantação da idade mínima não reduza as receitas previdenciárias em decorrência de baixos incentivos à contribuição. Para isso, é necessário que se generalize ou se aperfeiçoe o uso do fator previdenciário no sentido de estreitar o vínculo entre o valor dos benefícios e o total contribuído, de modo que uma opção por permanecer no mercado de trabalho e pagar contribuições previdenciárias venha de fato a se materializar em benefícios maiores quando comparados a quem fez opção contrária. De modo análogo, desenhar incentivos para que os indivíduos prefiram um benefício previdenciário ao assistencial, algo que se torna difícil de alcançar quando o valor do benefício assistencial para as rendas mais baixas em muito se assemelha, quando não se equivale, ao previdenciário.

MARCELO CAETANO é economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). E-mail: m_abiramia@yahoo.com.br. DANIEL DA MATA é economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). E-mail: daniel.damata@ipea.gov.br.