Título: Ação contra aumento de cargos
Autor: Braga, Isabel; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 05/11/2008, O País, p. 3

Com a crise, oposição tenta evitar criação de novos postos e aumento para servidores

Aoposição se mobilizou ontem, na Câmara, contra a aprovação, neste momento de crise internacional, de projetos do governo federal que criam cargos ou aumentam despesas com pessoal. Dois desses projetos - que abrem 7.800 novos cargos por concursos e outras 772 funções de confiança, com um impacto anual de R$343 milhões - estavam na pauta do plenário, mas foram retirados depois da ameaça de obstrução da oposição e posterior negociação entre os líderes.

A ofensiva da oposição aconteceu no mesmo dia em que o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, esteve na Câmara para pedir a aprovação de 164 cargos para a sua pasta.

Irônicos, os tucanos recorreram a declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, da semana passada, no Senado. Numa atitude inusitada, o ministro apelara aos senadores para que não aprovassem aumentos de gastos com o funcionalismo e a Previdência. Mantega voltou atrás depois, dizendo que se confundiu.

- Vamos seguir a orientação do ministro Mantega. Vamos obstruir a votação de qualquer projeto que aumente gastos - avisou o líder do PSDB, José Aníbal (SP).

O recado, endossado também por líderes do DEM, foi dado em plenário durante a fase final da votação do projeto que criou o Fundo Soberano do Brasil. Em seguida, entrariam os projetos dos cargos.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), ciente da ameaça de obstrução dos oposicionistas, convocou os líderes para uma reunião. Ao final, ficou acertado que hoje serão votados cinco projetos, mas nenhum sobre cargos.

"O problema é o momento de crise"

Entre os dois projetos que foram objeto de reação da oposição está o que cria cargos efetivos, comissionados e funções comissionadas no Ministério da Educação. O projeto cria 2.800 cargos de professor da carreira de magistério superior, 5.000 cargos técnico-administrativos e 600 funções de confiança para serem distribuídas em instituições federais de ensino. Ex-ministro da Educação, o tucano Paulo Renato Souza (SP) concordou com o veto à proposta neste momento.

- O problema não é a necessidade (de contratações), mas o momento de crise. É preciso dar um freio de arrumação. Nenhum destes cargos, se não criados agora, vai parar as universidades - argumentou Paulo Renato.

- Os deputados da base não têm responsabilidade fiscal. Eu acho que o discurso do ministro Mantega é para inglês ver - acrescentou o líder do DEM, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA)

O líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE), reagiu, defendendo a aprovação dos projetos:

- Criamos novas universidades e Cefets (escolas de ensino técnico). Se não aprovarmos os projetos, vamos ficar sem professores para essas escolas novas.

Haddad fará apelo na Câmara

Amanhã, o ministro da Educação, Fernando Haddad, irá à Câmara para conversar com os líderes e tentar convencê-los da necessidade de aprovação dos projetos.

De manhã, o ministro Patrus esteve com Chinaglia, para reforçar a importância de aprovação do projeto que cria 164 cargos. Patrus disse que a demanda do ministério aumentou muito nos últimos anos, e que é preciso reforçar o quadro de funcionários próprios. Segundo o ministro, o impacto das contratações, para 2009, será de R$13,8 milhões, incluindo todos os encargos.

- É um custo ínfimo em relação ao orçamento do nosso ministério. O projeto coloca o ministério à altura de suas responsabilidades. O que estamos pleiteando é plenamente razoável e irá garantir o funcionamento de nosso ministério - disse Patrus.

Se comparado ao orçamento da pasta, R$28,8 bilhões em 2008, o aumento de R$13 milhões pode ser considerado pequeno. Mas, com este valor, seria possível pagar, ao longo de um ano, o Bolsa Família para 6.318 beneficiários, considerando neste cálculo o valor máximo da bolsa, que é de R$182 - ou seja, uma família carente com cinco filhos menores de 18 anos. O valor do Bolsa Família varia de R$20 a R$182. O orçamento do Bolsa Família este ano é de R$10,3 bilhões, e, em 2009, de R$11,4 bilhões.

A assessoria do ministro Patrus Ananias informou que o Ministério do Desenvolvimento Social tem hoje cerca de 1,4 mil funcionários, entre efetivos, terceirizados e cedidos. Os 164 cargos, a serem preenchidos por concurso, reforçariam o quadro, principalmente para atender ao aumento de demanda. A assessoria diz que é menor, por exemplo, do que o número de funcionários da Secretaria Municipal de Assistência Social do Rio, que tem 3 mil pessoas trabalhando, segundo eles. Para a assessoria, o custo/beneficio desses 164 cargos se justifica, porque permitirá um atendimento melhor e maior fiscalização.

A assessoria acrescentou, ainda, que atualmente existem 58 restaurantes populares em funcionamento e outros 60 em construção, além de 3,7 mil centros de referência de assistência social, em 3,1 mil municípios.

Outro programa do ministério prevê a aquisição de alimentos de 110 mil produtores de agricultura familiar e a distribuição para 12 milhões de famílias. Embora os programas do ministério sejam feitos em parceria com estados e municípios, argumenta a assessoria, é preciso pessoal para acompanhar sua execução no país.

- O ministério tem ações em todo o país e não tem pessoal suficiente. É o ministério que concentra a maior parte das ações sociais do governo Lula - defendeu o relator do projeto que cria cargos para a pasta, Luiz Couto (PT-PB).